terça-feira, 31 de março de 2009

O Homem Que Proibiu o Cigarro

Face à crítica anônima dedicada ao meu passado, devo fingir constrangimento e tentar convencer o falso moralista que, no fundo, temos todos nosso lado maniqueísta. E por conta da evolução natural da espécie, creio eu, damo-nos por evoluir - e o que passou em nossa vida pode vir a ser narrado de tantas infinitas maneiras, boas ou ruins, que só depende de nosso senso de humor ou de sua autopiedade para definir o ponto de vista sobre ti mesmo. Eu, para tua íntima incomodação, optei sempre pelo "copo meio cheio". Sendo assim, ninguém é convidado aqui a ler o que lhe incomoda, mas será sempre um prazer recebê-los à minha exposição ideológica um tanto menos polêmica do que a economia e a política do Estado que te cerca, sobre o que tu sequer tens uma mínima opinião, quanto menos coragem para criticar.

PS: o texto a seguir contém doses de política, de economia e de pensamentos sociais. Por favor, se estiver procurando diversão, não leia.

E já que toquei no assunto social, hoje assisti a uma paletra sobre Economia True com um velhinho que deve economizar até rolo de papel higiênico. Parei de prestar atenção no meio, quando comecei a imaginar a Terra dos meus sonhos. Eu gostaria, como todo ser humano que se preze, de adquirir o máximo possível de poder. Algo como Luís XIV, eu queria SER o Estado, queria poder decidir tudo sobre tudo por um dia apenas. Algumas coisas mudariam, ah se mudariam. Em primeiro lugar, modelaria uma nova pirâmide social, na base da qual ficassem os manos "yo", as "piri", os seguranças de banco, todos os funcionários de colégios interioranos que não adotam o uso de livros didáticos, falsos moralistas, praticantes do Funk Melódico, maloqueiros em geral e a banda Calypso. No meio dela, encontrar-se-iam as pessoas de baixa renda, os índios integrados, estrangeiros ilegais, as dançarinas do tchan (e o cumpadre Washington), os apóstolos do Inri Cristo, Didi Mocó, todos os garis e membros do Lions Club (antes que eu seja perseguido). No topo, estariam eu, minha família, minha namorada, meus amigos (a nobreza deve ser sociável), os fãs de Mamonas Assassinas, os fãs de Sub Zero, Toni da Gatorra, todos os mendigos e qualquer um que apresentasse um bom motivo para tamanha honra.

Eu começaria dividindo a sociedade em territórios. Sim, com muros, talvez. Três partes.

Na primeira, completamente isolada do mundo, colocaria os traficantes, os viciados, os criminosos e todos os membros da parte inferior da pirâmide. Eles deveriam ser castrados, todos. Na segunda parte, separada por uma parede de vidro, ficariam os fumantes (antes que perca o cargo, pensem: poderia ser proibido). A terceira seria aberta.

Os crimes cometidos na terceira parte seriam julgados por mendigos. As punições oscilariam entre ser obrigado a viver na ala 1, com os criminosos (crimes mais graves), ou na ala 2, com os fumantes (com todo o respeito). Algum tempo depois, criar-se-ia uma quarta parte agregada à segunda, onde ficariam os fumantes que não jogassem mais toco de cigarro no chão. Após ter-se criado essa parte, o consumo de cigarro seria cortado da segunda ala. Em pouco tempo, todos aprenderiam uma lição: ou parariam de jogar tocos no chão, ou parariam de fumar. Quem parasse de fumar, ia ser bem-vindo à ala livre. Quem parasse de sujar, viveria na quarta parte até se reabilitar totalmente. Anos após, a ala 2 seria destruída, e a ala quatro seria reforçada com paredes de aço. Neste momento, o consumo de cigarro seria extinguido. Haveria uma grande crise econômica, aliada a uma grande revolta social, que, por sorte, seria facilmente controlada. Sob regime ditatorial, quem se rebelasse violentamente iria para a ala 1 (dos criminosos), que já estaria reduzida a 20% da população inicial. As revoltas internas e guerras desta parte seriam cada vez mais intensas, junto de doenças e de ócio econômico - um verdadeiro caos.

Assim que tudo se acalmasse, a ala 4 seria destruída e todos os habitantes restantes conviveriam com a ala 3. A partir daí, a população da ala 1 estaria comprometida e em pouco tempo extinta. Quando isso ocorresse, a economia daria um salto, tanto pelo fim do ócio, quanto pela diminuição considerável de miseráveis, o que certamente contribuiria para a elevação da nação a um grau superior. Os fumantes poderiam usufruir de seu vício novamente, só que através de importação. As leis seriam claras: qualquer lixo acumulado proveniente da indústria da nicotina acarretaria exílio. Em pouco tempo, o exemplo seria tal que nenhum lixo, de qualquer espécie, seria encontrado nas ruas. Com tanto esforço, os níveis de poluição seriam mínimos e a qualidade social aumentaria astronomicamente. Nesta altura, as pirâmides sociais deixariam de existir e o Social-capitalismo passaria a orientar a economia territorial. A parcela menos provida da população teria o direito à subsistência e à assistência total do Estado. A parte rica deveria obedecer às leis do cartel para que o monopólio jamais tivesse oportunidade de se estruturar. As dançarinas do tchan deveriam ser mumificadas e tidas como símbolos da cultura. Os fumantes conscientes teriam apoio do Estado na correção de seu vício, de modo que aos poucos tal produto fosse eliminado inclusive das fronteiras. A terceira parte (e única) da população sentir-se-ia muito infeliz. Após a proibição do cigarro, das drogas e a extinção dos crimes, a diversão fora muito comprometida.

Em dois anos, a camada baixa se revoltaria ao notar que os produtos gerados pela sua mão-de-obra eram de inferior qualidade. Por outro lado, a camada capitalista se revoltaria por considerar-se sem liberdade. Em pouco tempo, eu iria para a guilhotina e entraria para a história como o ditador mais burro de todos os tempos:

"O homem que proibiu... o cigarro". *Na sala de aula, caras espantadas*

domingo, 29 de março de 2009

Estupro Psicológico

PS: os nomes citados são, em sua maioria, fictícios, para não gerarem processos mais tarde.

Lembrando-me do meu longínquo passado, tive a brilhante ideia de postar aqui algumas de minhas peripécias e aventuras de colegial (àqueles a que essa palavra remete Sexy Hot e saias vermelhas, por favor saiam agora).

Então, um dia, chegou uma colega nova. Ela era estranha e do Uruguai, mal falava. Nome? Marina Victoria. Logo fez uma amiga, Edilana, uma gordinha muito simpática, que fez 90% dos meus trabalhos no segundo ano (e rodou por causa disso, coitada). De qualquer forma, a colega nova era meio cheia de si, embora introspectiva, e isso era um bom motivo para sacaneá-la.

Junto de meus companheiros with-no-notion, que na época eram cúmplices inabaláveis de bobagens que, hoje, faríamos 40x pior, resolvemos colar papéis com temas comprometedores. "Sou gay" e "Me chute" já não eram suficientes, então tive que pensar em algo maior para me sobressair, algo que seria analisado e discutido, deixaria uma impressão e acarretaria um choque imediato - o que, face às consequências cabíveis a um colégio de "freira", originava as gargalhadas nas ociosas bocas de outrem.

Eu, então, sabedor dos possíveis problemas que isso me traria, rasguei um pedaço de folha de caderno em que jamais nada seria escrito e anotei uma frase ameaçadora. Colei nela sem pensar duas vezes com adesivos da agenda. Ela não notou por horas. Gargalhadas soaram por todo o recinto. Eu, mais uma vez, recebi elogios do lado dark das pessoas. O caso foi abafado por algumas doses de conhecimento inútil (e, ainda assim, mal transmitido).

Alguns dias depois, percebi que um daqueles colegas acerebrados nosso, cujo nome fictício será André, estava mais uma vez se dando mal por algo que não fez. Meu Deus, como aquilo era engraçado. (Isso tudo parece muito pior hoje em dia). Depois de toda aquela cena prazerosa, tive uma daquelas ideias do mal. Sem pensar muito de novo, em busca de mais um pouco de auto-satisfação, escrevi seu nome bem grande na parede, de forma que algum mestre notasse e o punisse. Sem conhecê-lo, de fato, não tem a menor graça. Teria dado certo se um desgraçado - de quem, mais tarde, tive o prazer de me vingar - não me dedurasse em alto e bom tom para o professor corrente. Fui para a direção - e de lá para a psicóloga na mesma hora (acredito hoje que este fosse o procedimento apenas para os casos mais sérios).

Cheguei lá acompanhado de uma moça perigosa, à qual denominávamos "Rosa". Atribuo isso atualmente a uma espécie de escolta. Muita gente daquela instituição rezou para botar as mãos em um de nós, mas poucos conseguiam. No terceiro ano, objetos pesados eram trocados de lugar, e os papos do corredor das freiras eram "eu ainda vou pegar esse safado, eu ainda vou pegar e ele vai me pagar!". Graças a Deus, eu não tinha nada a ver com isso. Quase nada.

Mas naquele momento eu tava ralado. Fui caminhando de cabeça baixa - o perfil de todo culpado quando é capturado - até a salinha do último andar. Era uma daquelas cujas paredes são pré-prontas, uma madeira fina e exatamente simétrica, o que me faz pensar que a árvore foi aberta em cima daquelas tábuas. A Rosa fez um sinal na porta, que se abriu instantaneamente. Lá dentro, sentada no escuro, se encontrava a dona de muitas dores de cabeça: a Sra. Helen, "psicóloga" do corpo docente. Uma verdadeira inútil, mas no fundo era uma boa pessoa. Eu acho.

- Lucas, pode se sentar - dizia ela com a calma irônica de uma superior. - Temos algumas coisas para conversar.
- Pois não.
- Primeiramente, como tu estás? - sim, ela conjugava os verbos corretamente.
- Olha, a gente poderia ir mais direto ao assunto? Eu sei que errei, queria saber o que fazer para consertar meu erro. - velha tática do carpinteiro.
- Lucas, o que tu fizeste foi muito errado. Realmente acho que tu deverias indenizar a escola de alguma meneira, pois tu estragaste um pedaço da parede. É patrimônio da escola.
- A mensalidade que eu pago não cobre estragos e manutenção? - ela ficou pensativa por um pouco mais de tempo, mas não podia perder a pose para um truque tão banal.
- Lucas, a mensalidade que tu pagas não te dá direito de estragar o colégio. Quer dizer que, se eu pagar o ingresso, posso rabiscar as paredes do cinema?
- Tem carpete.
- Lucas, tu não estás me levando a sério.
- Eu aceito. Eu pago, tudo bem; agora eu posso ir? - disse eu, já aliviado por ter conseguido condicionar as coisas ao meu favor.
- Hum... não. Tem mais uma coisinha que eu queria conversar contigo.
- É?
- Sim - e ela tirou um pedaço de papel do meio de sua agenda. Lembro-me até hoje de como gelei. - O que significa isso? - me entregou o papelzinho, ainda com adesivo, onde se lia "Meu pai me estupra". Era o que eu tinha colado na colega estranha.

Essas experiências de 5 ou 6 anos atrás sempre me deixam confuso. Por que eu não agi de forma mais esperta? Como pude deixar acontecer isso? Cair num truque tão óbvio? Como deixei aquela instituição mal feita e mal administrada me pegar? Eles sequer pegavam eles mesmos, aqueles professores que não liam os trabalhos, não atribuíam notas justas, como?! Mas não era só isso: alguém havia me dedurado de novo, e não satisfeito, apresentado a prova do crime. Não podia fazer nada a não ser ocultá-la ali. Tentei utilizar um truque totalmente inovador.

Enquanto eu lia o papel com cara de infelicidade, amassei-o com calma e cuidado em meus dedos de modo que o próximo passo seria rasgá-lo, ou até engolir; minha mãe não iria suportar ter de ir mais uma vez até lá e ser humilhada por aquelas velhinhas hipócritas. Meu pai, se descobrisse, direcionaria sua raiva diária à minha epopeia. Eu estaria perdido, se não fizesse algo. E conforme ia amassando o papel, aplicando uma daquelas frases compulsórias, do tipo "eu não sei o que passou pela minha cabeça, realmente", fui interrompido pela sua fala, que, de amena, passou a apresentar um quê de raiva:

- Não-amassa-o-papel!

Eu parei na hora. Já era. Qualquer passo agora me comprometeria mais e mais... talvez uma suspensão, quem sabe? Já era o quarto termo que assinaria e jamais fora suspenso. A lenda era que dois termos era suspensão; três, expulsão. O que eu merecia, afinal? Forca ou fogueira?

- Eu tenho que conversar com teu pai. Sim, se com tua mãe já não adianta mais, vou falar com teu pai.

Gente, o que aconteceu a seguir é tão massante e complexo que nem eu mesmo lembro; mas fora um truque tão eficaz, que até hoje me orgulho. Consegui me humilhar ficticiamente perante a ela de tal forma, que seus instintos maternos afloraram na hora, e ela compreendeu que se mostrasse para meu pai, uma crise familiar tamanho família iria suceder-se. Arrisquei citar um possível divórcio, agressões físicas e até mesmo expulsão domiciliar. O mais surpreendente é que ela acreditou em cada palavra.

- Ok. Fato é que eu preciso entrar em contato com alguém da tua família. Já que tu me contaste teus problemas familiares, vou tentar uma última vez com tua mãe.
- Mas por favor, não conta pra ela o que te falei... ela iria me matar, com certeza, e iria contar pro pai também...
- Tudo bem, Lucas. Eu vou falar com ela sobre o acontecido. E mostrar o bilhete.
- Não... - cara de apavorado. Se minha mãe visse aquilo, ia ter um treco.
- Sim.

Ok, eu não poderia fazer mais nada. O preço ainda era alto, mas consegui reduzir 90%. Transformei uma tragédia em uma daquelas passagens esquecidas de nossa vida, que somente meia dúzia de pessoas vão lembrar até virarem pedaço de carne podre. Vocês.

Ao contar para minha mãe, a mesma chorou e me questionou "por que eu fazia aquilo com ela".

Essa é a cena que me vem na cabeça quando lembro de um dos atos mais corajosos que já tive.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Piriguete Way of Life

PS: se alguma mulher ler isso, é porque não se enquadra na ideologia abaixo expressa.

Dentre todos os mais famosos Bondes e Mc's brasileiros de toda a eternidade (os últimos 10 anos?) - e eu menciono os fenômenos da batucada sem compromisso, como Bonde do Tigrão, Tati Quebra-barraco, Mc Balaka, Mc Sapão, Mc Créu e até mesmo Mc Donald's (que virou até nome de restaurante) -, o melhor incomparável é o gigante, o sábio, o profeta do funk, o ilustríssimo senhor Mc Papo, autor da maior obra de Funk Lírico já ouvida nos cantos de nosso Brasil: Piriguete. Pessoas como o Mc Papo são abençoadas com o dom da composição inteligente, coisa que dificilmente se observa na música atual brasileira. Compositor de não só uma marcante melodia jamais pensada anteriormente, também desenvolveu uma letra de cuja sabedoria não se duvida; Mc Papo conseguiu expressar através da arte a completa imagem generalizada do ideal feminino de sua geração: uma Piriguete.

É engraçado como chegamos até aqui. As mulheres vêm buscando seus direitos há muitos anos, e desde a década de 50 têm observado os resultados. Elas não ficaram satisfeitas com o direito de voto: queriam trabalhar. Não ficaram satisfeitas com o direito de pegar na enxada: queriam dirigir. Não ficaram satisfeitas com o direito de arrancarem as portas de garagem: queriam liberdade sexual. Bom, quanto a esse último, temos convicção de que ficaram muito satisfeitas (até demais). E esse direito conquistado tem evoluído. A mulher não é mais comparada com um tanque de lavar, mas com um pacote de camisinha; a mulher não se parece mais com uma dona de casa, mas com um símbolo de luxúria; a mulher não lembra mais uma panela, mas sim uma cerveja, uma cama e apetrechos sexuais; não se pensa mais nela como uma futura mãe, mas como uma futura bunda, uns futuros peitos e, quem sabe, futuras posições. Gratifico-as por terem chegado tão longe - eu mesmo não teria conseguido tamanha graduação. Será que as tias setentonas estão satisfeitas de seu legado?

Mulheres nunca estão satisfeitas. Quanto mais cedo se aprende isso, melhor. E é pensando nisso que Mc Papo adquiriu inspiração suficiente para transcrever seus estudos em uma mús... batucada popular brasileira. Ele conseguiu botar nas rádios uma verdade que é aceita por 90% dos jovens brasileiros: o movimento de piriguetização das mulheres atuais. A competição é tanta para adquirirem este último plus nos direitos femininos, que até algumas regras estabeleceram-se; quanto mais infame, vulgar e apelativo, maior o seu Índice de Piriguetização - e, consequentemente, maior o seu potencial Piriguete. Acredito que poucas chegaram ao último nível, mas não é preciso pânico: em breve surgirão novos métodos de alcançar-se tal vocação - mas com outro nome e outra "canção". Embora não perceberemos esta última mudança (pode acreditar).

Mas o que é preciso para ser a maior piriguete, afinal?
Bom, para responder a esta questão, far-se-á necessária uma intensa pesquisa direto da fonte, para que possamos interpretar a idealização da mulher brasileira em batuques arritmados:

"Mini-saia rodada, blusa rosinha
decote enfeitado com monte de purpurina
Ela não paga, ganha cortesia
Foge se a sua carteira tiver vazia"

A partir deste trecho, podemos verificar que boas Piriguetes não podem prezar pela intelectualidade. Precisam se vestir tão atraentes quanto um bife mal passado. Ao mesmo tempo, é preciso atingir um belo nível de persuasão, saindo de casa sem dinheiro algum e suprir todas as necessidades do capitalismo através das vítimas de seu parasitismo sensual. É disso que se trata o terceiro verso: a Piriguete é uma Parasita Sexual por obrigação. O último verso narra o comportamento fútil surgindo como fator decisivo no desfecho da aventura noturna: uma Piriguete jamais aceita promissória. Toda a sua experiência de vida deve servir para ajudá-la a diferenciar um homem com tostão de um homem... sem tostão.

"Vai na Micareta
vai no Pop Rock
Festa de axé ela só anda de top
Ela usa brilho, piercing no umbigo
Quando toca reggae então ela quer ficar comigo"

Através desta estrofe, é possível compreender que uma Piriguete de linha deve ser muito bem informada - ir a todos os maiores eventos (de graça. Vide a lei da estrofe anterior). Também deve manter sua aparência apelativa em todos os segmentos de seu corpo (é possível inferir na versão original do batuque). Também deve ter um vasto conhecimento musical. Até para saber a tênue linha que agrupa Bob Marley e Armandinho.

"Foto de espelho na exibição
Ela curte funk quando chega o verão
No inverno essa mina nunca sente frio
desfila pela night de short curtinho
Um cinco sete de marido
ela gosta é de cara comprometido
Não tem carro, anda de carona
Ela anda sexy toda guapetona
Ela não é amante, não é prostituta, ela é fiel, ela é substituta"

Aqui percebemos a primeira definição concreta de o que é uma piriguete. Talvez esta seja a estrofe mais importante da obra. Quem de nós já não conheceu no mínimo 7 (mil) moças que curtem uma bela e apelativa foto no espelho? Mas não é dessa definição que a estrofe fala; é apenas a síntese. "No inverno essa mina nunca sente frio". Percebam que, neste trecho, o poeta define que o comportamento piriguetiano é constante em função do tempo. "Um cinco sete de marido" é uma expressão de português culto, mas tão culto que não é possível inferir muito a seu respeito. O que podemos extrair de tal fragmento - através do contexto - é que possivelmente ela não respeite relações conjugais alheias. O ante-penúltimo verso confirma a hipótese do Parasitismo Sexual expresso na primeira estrofe. "Guapetona" é uma palavra muito bem construída; suas origens partiram da língua espanhola, onde guapa significa charmosa. O aumentativo foi muito bem aplicado na construção desta ímpar expressão que certamente deverá ser usada a partir de então. E, por último, podemos concluir desta estrofe que uma Piriguete True não é sinônimo de prostituta! Por favor, quem pensou isso, peço que procure ajuda psiquiátrica. Uma piriguete é completamente fiel. O único porém é que suas relações afetivas têm curta duração (em torno de 10 segundos, se não houver dinheiro na jogada). Uma piriguete é uma substituta erótica - quase uma boneca inflável em movimento.

"Ei governador, lá em Salvador,
Rio de Janeiro, Santos e Belo
todo mundo já conhece, sabe o que acontece
quando vê a gente ela se oferece
Mexe o seu corpo como se fosse uma mola
dedinho na boquinha, ela olha e rebola
chama atenção, vem na sedução, essa noite vai ser quente
eu vou dar pressão"

Você, leitor, já deve ter criado uma noção íntegra do significado de uma Piriguete na cultura brasileira. A Piriguete divide espaço com inúmeros fatores que unificam o povo brasileiro em um Estado, como o futebol, o carnaval, e por que não as drogas. É sabido que o termo já é famoso em vários cantos do país, para não dizer todos, e portanto inferimos o seguinte: a Piriguete não deve poupar esforços para conquistar o que deseja sem gastar nada: deve ser tão oferecida quanto uma cadela no cio (se algum cachorro estiver me lendo, peço perdão pela comparação). A elasticidade requerida no Curriculum Pirighaetis é tão desenvolvida quanto a de uma atleta de ginástica olímpica. E não só deve ter tal competência corporal, como deve também ter noções de sexologia e, por que não, de Break Dance. É preciso ser impecável para humilhar as piriguetes concorrentes de um evento. Por último, notamos a clara influência de Bonde do Tigrão no segmento "eu vou dar pressão".

E, para finalizar, é preciso compreender direitinho o que a marca da música, seu refrão, quer nos passar.

"Quando ela me vê
ela mexe
piri pipiri pipiri piriguete
rebola devagar
depois desce
piri pipiri pipiri piriguete"

Absolutamente nada.

Portanto, após esta vaga ideia de o que é este ícone nacional, deixo um recado para a minha amiga Piriguete (se é que alguma chegou até a segunda linha): não seja igual ao povão; treine. Na atual sociedade, não basta ser bom: somente os melhores se destacam. Seja uma ótima piri, pipiri, pipiri piri piriguete!

segunda-feira, 23 de março de 2009

Crente Canibal VS Gigante Rosado


PONTO DE VISTA #1:

E eu fui pegar um copo de água preta mas minha visão foi completamente escurecida por uma imagem ímpar: um gigante louva-a-deus vegetava dentro do armário de copos e, não por acaso, em cima de um. Ele sequer respirou ao me notar. Sabedor do potencial sanguinário deste terrível e ameaçador monstro verde, pus-me a pensar em maneiras de detê-lo - como um típico ser humano. Ok, confesso que agora isso parece totalmente desnecessário, mas meus instintos de Homo Sapiens fizeram-me desejar sua morte mais do que respirar. No entanto, os documentários que assisti sobre o "rei dos insetos" conseguiram aumentar as batidas por minuto de meu coração desregulado. MEDO.
Eu não sou lá um sujeito covarde; mas não gosto de me meter com perigo. Ora, é totalmente incômodo assassinar um animal que poderia muito bem arrancar meu olho (e por que não?). Eu precisava utilizar o único fator que me daria alguma vantagem nesse combate fatal: a minha capacidade de pensar. Pensar! Oh, eu penso! Eu acho que penso... eu... penso? Dúvida cruel.

Ele queria brigar. Conquanto estivesse parado na mesma posição por prováveis horas, sem sequer mexer a cabeça, enquanto eu o contemplava com olhar de vampiro, ele não fugira; ele não temera! Ora, que audácia! Tenho no mínimo dez mil vezes seu volume! Era preciso fazer algo.

Como, no mesmo dia, havia sofrido um enxame de vespas assassinas passageiras e, para afugentá-las, vesti-me de "Esquimó da Antártida" (mas quando cheguei lá, elas já tinham migrado de novo), percebi que nada é por acaso. Vesti algumas partes de tal fantasia, principalmente as luvas que me evitariam ver meu sangue derramado em suas garras lentas e afiadas, seu veneno mortífero como uma naja cospideira. Ele poderia me matar, isso era fato. (Parem de duvidar disso, caramba!). Peguei uma escumadeira grande de metal e cobri-a com um pano de prato usado. Abri cautelosamente a portinha do armário dos copos e cutuquei o animal. Ele não se mexeu. Cutuquei com mais força. Ele pulou de um copo para o outro com muita calma. Era hora de agir.

Com a luva - muito cagadamente - peguei a parte de baixo da taça em que o Monstro Canibal adquiria suas forças malígnas e trouxe-a para fora do armário. Ele farejou meu medo: começou a planejar seu ataque com muita precisão e astúcia. MEDO. Ele começou a rezar. SIM, É POR ISSO QUE SE CHAMA LOUVA-A-DEUS! Ele reza, provavelmente para o seu Deus-Canibal, visando ao meu sofrimento, à minha derrota, à minha morte lenta e dolorosa, e provavelmente esperando que ele mesmo comesse minha maciça carne, até ficar tão grande quanto um ser humano e sair louva-a-deusando por aí, comendo todos com muita calma e paciência diabólica. Com suas patas unidas e seu tronco de pé, virou quase 180º para olhar-me nos olhos - o que me fez utilizar a escumadeira com a outra mão; eu o isolei dos meus olhos, para caso resolvesse voar, mas ele estava virando calmamente cada vez mais, e eu não podia mais fazer nada: certamente não chegaria até a porta para jogá-lo de volta à natureza, onde poderia MASSACRAR os seus semelhantes até que uma fêmea o devorasse a cabeça. Quando ele se virou os então 180º completos, apavorei-me de tal maneira que acabei agindo como uma bicha fresca, talvez até pior do que a do segundo post, caros colegas. Eu o acertei com um leve tapa da escumadeira, o que o fez voar até a parede mais próxima, e eu passei a me sacodir e gritar de forma aguda e feminina, sapateando tanto quanto um dançarino de tango. (no tango se sapateia?) Por fim, minha namorada riu de mim, já que acompanhava de longe minha batalha sangrenta pela vida. Ele pousou verticalmente na meia-parede que separa a cozinha da sala e lá ficou, totalmente desconfiado. Mas sua irracionalidade não o fez perceber que ali era um alvo fácil para uma bela e suculenta chinelada.

Eu respirei um pouco (bem afastado) e então resolvi terminar o que deveria ter feito com maestria de outrora. Tive uma brilhante ideia: peguei com fúria em minhas mãos a maior arma já confeccionada pelo ser humano, que desde 1962 já fez milhares e milhares de vítimas, dentre insetos, aracnídeos e até mesmo maridos indefesos: as Havaianas! Ela era preta - tão eficiente quanto um revólver nas mãos de quem sabe manuseá-la. Mas eu saberia? Bom, o medo de ele dar o bote milésimos de segundo antes de a sandália grotesca acertar-lhe as vísceras verdes e gosmentas foi decisivo para eu errar EM CHEIO a primeira tentativa. Ele notou o perigo e pulou para baixo de um banco de pernas compridas, aqueles de barzinho. MERDA, eu nunca ia pegá-lo ali. Ele finalmente aceitou a briga com tudo, estava pronto para devorar meu cérebro com a destreza de um crente canibal. Sua posição era de um ângulo de 90º com o chão - estava quase de pé; os ruídos que emitia após a chinelada mal-dada era de assustar até mesmo um leão heterossexual. Eu tinha duas opções, àquela altura da madrugada: deixá-lo ali e torcer para que não se vingasse, ou atacá-lo até a morte de um de nós dois. E optei por esta última.

Retirei com muita rapidez e cuidado o banco de cima dele e errei mais uma chinelada, mas ele pouco se mexeu. A terceira foi fatal. Ainda assim, vieram mais umas cinco, não sei se por raiva ou por pena. Eu venci.

... e olhando para seu cadáver minúsculo, totalmente esmagado no meu chão claro, percebi o quão ignorantes são os seres humanos. (Foda-se, botei vocês junto).

Apesar disso, dormi com a sensação de que, sem sombra de dúvidas, era o maior herói e guerreiro viamonense.




PONTO DE VISTA #2:

Não lembro como fui parar naquele inferno. Não havia nada verde, a não ser eu mesmo, num raio de 10 metros. Tentando refletir, mal pude perceber que ficara estático desde o nascer até o pôr-do-sol daquele dia. Durante esse tempo, vi criaturas extremamente assustadoras. Uma delas, mais precisamente longas horas após o sol ter-se ido, foi a primeira a me notar. Eu não achei que ele fosse encher meu saco, ora, afinal eu sou o Louva-a-Deus.

Mas ele resolveu dar o bote. Percebi que estava aflito com minha presença, mas o que podia eu fazer? Ele era um gigante, um gigante cor-de-rosa, e eu era apenas o rei dos insetos. Ele me esmagaria com a palma da mão antes de perceber que eu não tenho veneno. Ele pegou alguma ferramenta - típico de um ser desse tipo - e passou a encostar em mim. Ora, se eu tivesse seu tamanho... por que tanto receio? Enfim, tive de utilizar seu medo ao meu favor. Quando ele agarrou o objeto transparente em que eu repousava tão tranquilamente, percebi que ele iria tentar um daqueles truques fracassados de bichos grandes. Fiz pose de malvadão e fiquei à espera. Esperei ele agir para voar até algum lugar onde pudesse me camuflar. Mas acho que a inteligência desses animais, embora limitada, os fez retirar qualquer tom de verde de seus lares, para que eu, o Deus dos Insetos, não pudesse usar minha camuflagem perfeita.

Ele foi buscar alguma coisa, algo bem mal feito, preto e achatado. Não sabia bem o que ele iria fazer com aquilo, talvez alguma forma de ritual, mas quando mal pude perceber, aquilo voou em minha direção. Sorte que sua pontaria e precisão eram ruins. Pude me esconder embaixo de um objeto tão gigante quanto ele, e lá comecei a emitir sons que apavorariam até mesmo um morcego velho. Subi em meu próprio corpo, fiquei ereto como ele. Acho que o apavorei tanto que isso custou minha vida.

Quando a sombra do objeto em que me escondia sumira, ouvi um grande barulho e fiquei estático. É a última coisa de que me lembro antes de virar matéria orgânica reciclável.

Malditos humanos.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Adiós, muchachos!

A partir do início do dia 19, faço dois anos de namoro. Mas, embora seja muito interessante pra mim, não deve ser para vocês, portanto vim contar o outro fato aliado a este insignificante dia. Começa minha jornada anual, e não devo postar mais com a frequência anterior, porém, no mínimo semanalmente isto há de acontecer. (Eu acho). Para não ficar em aberto isso aqui - detesto posts pequenos - e para não dizerem que me dou muita importância, hei de contar uns pedaços radicais do meu dia de hoje.

Hoje tive de passar no banco pra retirar cheques. Acontece que, como havia retirado um talão recentemente, supus que não daria certo retirar mais um pela máquina e fui logo passando pela MALDITA, SANGUINÁRIA, DETESTÁVEL porta giratória com detector de metais. Fiquei preso nela.

Voltei antes que fizessem perguntas, pois lembrei que estava acidentalmente com minha arma de choque elétrico junto na pequena sacola que carregava com o presente de minha namorada. Com os seguranças viamonenses me encarando, fingi desistir de entrar lá e fiz de conta que estava ligando para alguém, como se uma porta giratória tivesse alterado todos os meus planos daquele dia. Funcionou, pois pararam de olhar para mim como se eu portasse uma arma de choque.

Fui até a máquina de cheques e, curiosamente (mas graças a Deus, pensei) funcionou. Emiti os devidos cheques, sempre cuidando para que ninguém olhasse diretamente para dentro da sacola. Demorei o suficiente com os cheques para que não desconfiassem de mim, já que os seguranças, volta e meia, verificavam se eu não sacara nenhum revolver daquela sacola branca e dura. Quando terminei, porém, descobri que faltava grampeador. Fui até a "moça que atendia" ali de pé e ela me disse que só lá dentro. Agradeci e voltei até o canto em que estava na sala das máquinas ainda. "Eu definitivamente não vou passar por essa confusão por causa de um grampo". Resolvi ir embora e resolver depois, tinha ainda de ir à Cidade Grande resolver uns imprevistos.

Nisso, liga meu pai. Queria que eu sacasse uma quantia interessante nos caixas lá de baixo. Seus pedidos são entendidos como ordens desde que me vejo por gente, e não questionei ao ouvi-lo. Droga. Tive a brilhante ideia de consultar a moça de novo. "Tem algum jeito de chegar aos caixas sem ser... bom, como faço para chegar aos caixas?" e ela, nem um pouco desconfiada, respondeu "Ah, tu passa aqui por dentro e desce as escadinhas". Será possível que esse banco desconfia tanto assim dos viamonenses? São eles que botam aquele maldito capital ali! Sem outra alternativa, e devido às pressões, respirei fundo e fui até à porta.

Tentei, frustrado, passar pela porta, que trancou no meio de novo. O segurança, dessa vez, não deixou-me escapar; veio falando para eu deixar o que é de metal no vão entre a parede de vidro. Espertamente, coloquei a sacola inteira ali. Mas alguém lá em cima queria rir um pouco, e a fez um pouco maior do que o buraco; não consegui enfiar lá. O segurança, curioso, deu uma ordenzinha irritante: "Pode abrir pra nós, por favor?" e eu fingi não entender, mas após a segunda vez o tom da voz dele me fez perceber que nem o velho mais aparelhado do mundo deixaria de compreender aquele pedido. Já me defendendo, expus: "Só tem minha arminha de choque aqui, que uso pra me defender... mas não tem problema né?" e ele me olhou apavorado enquanto eu tirava o objeto de dentro da sacola e botava-o, solitário, na caixa transparente. Ele analisou, analisou e falou: "pode passar". Após, mandou-me esperar. Chamou um superior (ou alguém que considerava entender mais de eletricidade) e ambos discutiam o que fazer. Perguntaram para que eu usava isso. Senti-me superior explicando pausadamente: "Bom, eu uso isso pra me defender, é só defesa pessoal mesmo". E ele: "e tu anda com isso em tudo que é lugar?"
- Bom, eu ando onde acho que vai ter perigo.
- Tu acha que em um banco vai ter perigo?
- Cara, eu ando onde eu quiser com isso, é completamente legal e registrado - falei isso sem a menor precisão. Somente ouvi boatos sobre esta maldita tomada móvel desde que a comprei. Os seguranças se olharam, pensaram um pouco e um deles falou: "Tá, faz o que tu tem que fazer e pega aqui comigo depois".

Com nervos em erupção, concluí a tarefa paternal e busquei a arminha na saída, agradecendo e mostrando a ele o selo de garantia, tentando ainda passar a conversa. "Tá até aqui o registro, ó". E o cara foi obrigado a demosntrar o interesse que conteve antes: "e isso funciona mesmo?", ao que respondi: "olha, só testei em mim até hoje. Dizem que pra defesa é bom; mas não passa de um choquezinho de tomada". "Ahn... então tá". "Ok, tchau".

Tchau.

*Pai liga* "vem até o unibanco aqui entregar" *Pai desliga* *Lucas obedece*

"Por favor, não esteja atrás da porta giratória, por favor!". Entrei no tal Unibanco em que ele se encontrava. Uma multidão se debatia na sala das máquinas. Não o vi. Ia tentando olhar para dentro da porta de detectores para chamá-lo para ali. Quando estava pronto para dar outra explicação, ouvi um assovio: "To aqui, rapaz". Graças a Deus, alguém me deu uma trégua! Ele estava na mesma sala que eu! Rapidamente, entreguei a quantia requisitada e os talões de cheque.

- Isso aqui tá desgrampeado, guri. Pede um grampeador ali dentro - e apontou para a porta giratória.

Então é isso rapaziada, vejo vocês em breve! Beijos com sabor de galinha frita!

quarta-feira, 18 de março de 2009

Erro Pornô (pt. 2)

E final. Essa foi uma das histórias mais ridículas que já protagonizei em toda a minha vida.

Eu estava atrás dos vídeos que havíamos visto, eu e meu amigo Barradas, na noite anterior. Eu fui escolhido (sem tirar no palitinho) para ser o que deveria entregá-los à locadora; então, caminhei com pressa até sua casa, já que em breve perderia minha carona para casa (mãe). Chegando lá, a casa estava - como de costume - vazia, mas não entrei em desespero; sempre soube onde a chave ficava, assim como todos os amigos de Barradas. Fui até o local sagrado e, com muito esforço, pus-me a contorcer o braço até encontrar o objeto que salvaria a tarde e me permitiria concluir minha missão. Mal sabia eu que, o que estava por vir, jamais seria esquecido por mim e por muita gente. (Peraí, Clodovil acaba de virar purpurina).

Ok, megalomanias à parte, vamos seguir esta inútil história. A chave não estava lá. Satisfeitos? Não, não estava lá! ELA SEMPRE ESTAVA LÁ! Mas é óbvio; naquele dia, ela não estava. Aliás, por que eu estaria contando essa história se tudo tivesse saído como eu queria? Eu não achei a maldita chave. O que faria? Pagaria o dobro do valor em multa? Caramba, por que Barradas não fez a tão simples parte dele de liberar o caminho?

{Não culpem Barradas. Ele não fez por mal. Barradas é um sujeito completamente interessante. Não conheço alguma pessoa que o conheça bem. Filho de agrônomos espíritas, é o mais novo de cinco irmãos, e não menos estranho. Ele sempre nos surpreende com algo, mesmo após quase uma década. Certo dia ele apareceu pelado e (conteúdo censurado) a noite toda. Eu escrevi uma novela dedicada a ele, chama-se A Bíblia Albina e possui comunidade própria no orkut com toda a história. (Sim, é uma obra humorística). Pesquisai}. Nós te amamos, Barradas!

Após este flashback, volto a contar a dolorosa descoberta. Voltar era um conceito descartado: precisava achar um jeito de entrar naquela casa. Faz-se necessário um outro flashback. (Tá parecendo Lost isso aqui):

{Alguns anos antes, durante a doce época escolar, eu tive de invadir a casa do barradas através das grades da cozinha por algum motivo. 10kg mais magro, consegui sem dificuldade}

Nesse recente dia, porém, a ideia me passou pela cabeça novamente, mas o fato de estar 10kg mais gordo pareceu não fazer parte do meu íntimo intelecto. Eu tentei, e, obviamente, fracassei. Demorei horas para pular até a viga que sustenta o lado de fora da janela da cozinha, onde se encontram as grades. Eu consegui chegar lá, lado a lado com a janela, frente a frente com a grade da cozinha. Elas tinham um espaçamento de um palmo, talvez pouco menos; mas é óbvio que não vemos facilmente as mudanças negativas em nossa vida.

Quando entalei na grade, a uma altura de três metros do chão da rua e um metro e meio do chão da cozinha, percebi que o cheiro daquilo era terrível. A grade estava coberta de substâncias gordurosas e dejetos felinos (um presente do Esperidião, fugitivo gato do Barradas). Eu estava entalado, engordurado e cagado. Alguns minutos depois, consegui sair para fora da casa de novo. É, era impossível passar por aquelas grades; além disso, estava me sentindo um pedaço de esterco.

Passei alguns momentos esperando do lado de fora da casa de novo. O que fazer? O tempo estava passando, era preciso agir rápido. O dvd estava no último andar, mas eu não conseguiria chegar lá sem entrar em alguma daquelas janelas próximas de mim. Deus queria que eu me desse mal e me fez enxergar a janela entreaberta no quarto do Barradas.

Empenhei-me como um macaco-prego para adentrar aquela alta janela. Havia algumas lenhas ali perto, e usei-as primeiro para afastar o vidro, e depois as coloquei abaixo de mim para alcançar mais facilmente a tal abertura. Com algumas sujeiras na parede (e mais ainda em minha roupa), consegui pular para o quarto do indivíduo. E adivinhem o que encontro ao lado de sua cama? Sim, a chave. Criei uma teoria (último flashback, prometo):

{Barradas chegara tarde na noite anterior. Havia esquecido a chave de casa. Por isso, usou a reserva (motivo pelo qual não estava no lugar em que procurei). Em vez de colocá-la de volta no esconderijo, o esquecimento o fez levá-la consigo no bolso. Ao chegar em seu quarto, com muito sono, tirou as calças e esvaziou os bolsos, só então percebendo que sua chave reserva estava lá. A preguiça o fez deixá-la em um local onde se lembraria pela manhã. Mas isso não aconteceu. Óbvio}.

Tá bom. Não havia tempo a perder. Eu ainda estava fedendo e queria mais do que nunca ir para casa. Subi as escadas com pressa e agarrei o dvd com fúria. Foi quando notei que o cheiro de merda não era psicológico: minhas roupas estavam devidamente nojentas. Precisava, mais do que tudo, tirá-las - e o local era tão seguro... Barradas estava sozinho havia muito tempo. Seus pais estavam possivelmente na praia, ou em alguma de suas viagens inexplicáveis.

Eu tirei minhas calças primeiro. Depois, tirei vagarosamente minha camisa e me senti o homem mais limpo do mundo! Ah, que alívio não estar mais cagado, cara. Bom, vestir aquilo era a última coisa que eu queria, portanto... fui tratar de despachar o DVD. O tempo que levei foi muito extenso, e não daria tempo de levar na locadora. Botei o valor integral da locação em um local à vista e desci para usar o telefone. Desci as escadas, passei por inúmeros cômodos e cheguei até a sala do computador, só de cueca, onde o aparelho se localizava, e de lá liguei e orientei minha mãe, que estava a caminho. Desliguei o telefone me sentindo um homem livre. Barradas só chegaria algumas horas depois, e ele entenderia completamente. Estranho; nessa hora ouvi um barulho vindo de fora da salinha. Devia ser o Barradas. Ora, teria de explicar e ele ia rir um pouco, mas nada de preocupante. Atento a isso, fui em direção à porta da sala do computador e entrei no pequeno corredor que o separa da grande sala. Na direção oposta, vinha uma das maiores surpresas da minha vida. Fernando.

Fernando é um dos irmãos de Paulo. Ele é um sujeito completamente sério. Sério mesmo, nunca o vi sorrir. Também o vi pouquíssimas vezes; ele ignora muitas coisas, é daqueles caras misteriosos que provavelmente se atentam muito ao trabalho e nada mais. Um típico homem de negócios, com um óculos e aparência de intelectual. Ele deve ter 37 anos (chute). Vou descrever a cena e o diálogo com total precisão, na íntegra mesmo.

Fernando vem em direção à salinha, olha para mim, olha para minha cueca, abaixa a cabeça, cumprimenta tão baixo e secamente que mal pude diferenciar de um arroto discreto e depois entra na salinha do computador. Eu fico em estado de choque por alguns milésimos de segundos, mas como sempre, em situações desse tipo é necessário agir. Foi então que regurgitei a frase mais natural que já consegui formular:

- Eu tenho uma ótima razão pra estar assim. - Fernando deixa levemente o músculo do maxilar mexer-se para um dos lados enquanto sua cabeça seguia baixa, o que entendi como um sorriso. O silêncio me corroeu por tanto tempo, e me senti tão açoitado que tive de reagir de novo - Eu sujei minhas roupas de um jeito inacreditável!

Mas ele não falou ABSOLUTAMENTE NADA!

Ainda chocado, subi as escadas e me vesti instantaneamente. Me senti uma ninfeta sendo descoberta pelo pai em posições eróticas para a webcam. E a dor era quase a mesma. Meu coração palpitava de modo assutador. Lá de cima, já vestido, pude notar que ele já havia feito o que tinha que fazer (ele não morava lá, apenas tinha ido usar o computador por algum motivo) e estava indo embora, passando pela sacada interna que permite que de um andar se enxergue o outro. Não satisfeito com a desculpa dada, arrisquei um "Vou pegar uma calça do Paulo emprestada, tudo bem?" e recebi de volta um "Pode pegar...".

Conforme não ouvia mais seus passos, afundei-me em lástimas e pena de mim mesmo. Desci de novo e escrevi parte do que aconteceu para Barradas, e só não concluí porque minha mãe chegara; veio junto de meu pai. Contei a eles para aliviar a culpa, mas eles riram. Contei a todos os amigos pelo mesmo motivo, mas todos riram.

Mas para mim... o trauma só foi superado... ontem.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Erro Pornô (pt. 1)

Hoje pela manhã ocorreu algo tão absurdamente absurdo, que me fez lembrar de um episódio AINDA PIOR. É, ambas foram peças que a vida pregou durante minha breve existência. E jamais se desculpou. Como o primeiro fato (que é menos extenso temporalmente falando) me tomou muitos caracteres, deixarei o segundo para um futuro post. Para os cinco leitores do meu blog, lá vai uma dica: cobrem-me, ou vou esquecer.

Sem mais demoras, tudo aconteceu quando "acordei" um pouco mais cedo do que o normal e, como de costume, fui banhar-me para acordar de fato. Ao chegar no banheiro de cima, ao lado do meu quarto, despi-me e liguei a gélida água no máximo. O tempo passava e ela não esquentava. Como todo santo mês, concluí que havia faltado gás e iniciei o contato externo com a Dona Cleci (uma incansável senhora que trabalha e acompanha minha família desde pouco antes de meu nascimento, provavelmente por alguma espécie de promessa ou carma). A Cleci me informou que muito provavelmente estaria faltando gás (...).

Vesti a peça mais íntima possível e, por me sentir íntimo o bastante, resolvi atravessar a casa somente com a própria. A ideia era descer as escadas, passar pelo escritório (uma segunda sala) de minha mãe e chegar ao quarto dela, onde havia um banheiro melhor acessorado que dependia de uma outra fonte de gás. Com uma toalha às costas e uma cueca na cintura, parti (ainda em estado de choque pós-sono) em direção à difícil jornada que havia planejado. De longe, pude perceber que havia uma moça na parte de baixo, de costas para a escada, junto de minha mãe no escritório. Tinha cabelos lisos castanhos e usava uma blusa rosada; tinha estatura pequena e aparência infantil. Minha mãe sentava à frente dela e de frente para a escada. Uma mesa de escritório separava as duas. A jovem estava de cabeça baixa, como se estivesse desenhando algo. "Há, é só a Thays"; Thays é minha irmã. Alvo totalmente ignorável.

Segui até a escada e fui descendo sem o menor pudor. Minha mãe passou-me a olhar com um sorriso quase que pálido enquanto alcançava a metade inferior da escada. Algo me passou: o que a Thays fazia ali àquela hora, se estudava de manhã? (Pausa dramática).

(Alguém ainda não entendeu o motivo de este blog se chamar Tenha Muito Cuidado?)

Não, amigos, não era a minha irmã, mas uma cliente de minha mãe prestes a assinar um contrato de construção civil almejado por meus pais durante as três últimas semanas. E eu de cueca, parado na escada com uma toalha nas costas.

Eu me pergunto o quão rápido era preciso ser para sacar uma arma durante um duelo típico daqueles filmes de bang-bang. Calculo que o tempo que eu levaria para subir aquela escada de volta antes da moça presenciar essa cena lastimável deveria ser o triplo do que levaria para desenrolar a toalha e cobrir meu corpo, e assim o fiz. O barulho que faria subir aquilo de novo iria fazer com que ela se virasse quase que instantaneamente, e então viriam a surpresa, as perguntas e os questionamentos... poderia esperar um sorriso envergonhado, ou uma cara de espanto, não é possível saber pois eu não conhecia aquela mulher. Bem, a moça ainda estava de costas, concentrada em algo, e eu, na realidade, tinha duas escolhas: voltar com estardalhaços humilhantes e ser descoberto como um fracassado, ou seguir em frente fingindo se tratar de algo completamente normal (e ser descoberto do mesmo jeito). Esse negócio de indecisão é completamente relativo; eu me considero o cara mais indeciso que já conheci (ou talvez não, não sei...) (entenderam a piadinha no parênteses ao lado?), mas ninguém que passa por uma situação desse tipo demora mais de 0,3 segundos para calcular o que é menos pior para si e para os negócios da família. Eu resolvi passar pelas duas e chegar até o quarto de minha mãe. Acho que a velocidade dos meus passos foi semelhante à do papa-léguas fugindo daquele lobo com nome de cacto alucinógeno mexicano. E eu tomei o banho mais demorado dos últimos tempos.

O fato é que, por uma determinação divina, o desfecho dessa história foi diferente daquele que ainda estou para contar. Sim, foi menos vergonhoso, foi menos assustador, me senti menos culpado! Ao perceber que o carro dela se afastava do meu terreno, saí do banho rapidamente para ver o estrago do meu segundo maior erro pornográfico, e o que ouvi foi tão saboroso quanto um torrão de açúcar equino:

- Ela não viu e fechou o contrato.

(Sorrisos extramaxilares)

Senti como se tivesse provado para mim mesmo que havia novamente desafiado os perigos do meu corpo. Mas, dessa vez, quem riu fui eu mesmo.

domingo, 15 de março de 2009

Grande Kagada

Certo dia, um amigo meu sugeriu que eu deveria tentar ganhar a vida como escritor. Eu respondi, educadamente, que ele deveria ganhar a vida como profeta. Ele fingiu entender, mas não; e é por aqui que vou explicar. As chances de eu escrever um livro bom e sustentável são ainda menores que as de ele acertar a sorte de uma madame rica e supersticiosa. Ademais, sou tão bom nisso quanto ele em magia. Mas se ganhares na Mega-Sena, retiro o que disse. E me procura.

E porque eu não sou um escritor, mas um cara normal, cometo cagadas normais. Uma delas? Eu poderia alimentar um post por dia só com uma parte (e não me orgulho disso). Mas uma bem ilustrativa aconteceu há alguns meses, quando descia a rua Pixinguinha, onde minha glamurosa namorada mora. Pausa breve para a descrição da pixinguinha.

{Pixinguinha: típica rua viamonense de chão batido, buracos XXL, pessoas à granel e construções inacabadas, sem final visível, com inúmeros becos ao seu comprimento, uma gangue de crianças inoportunas, iluminação desfavorável, e é melhor parar por aqui antes que ela me enterre em seus confins de terra vermelha}. Mas, antes de tudo, não fica sequer um ponto atrás da minha e das demais ruas de Viamão no Concurso Miss Rua Viamonense 2009.

Bom, vinha eu descendo a Pixinguinha à noite, noite mesmo, e só enchergava a área de iluminação do poste mais perto - a vários metros de mim. Há algum tempo, a família dela havia comprado um Ford Ka preto, com toda a sua elegância e estilo (não é ironia). Conforme ia me aproximando de sua casa, ainda em uma leve descida, o Ford Ka preto aparece subindo a rua em minha direção. Certo; não é uma rua de movimento - nunca vi mais de dois carros se cruzando, a não ser em dia de festa ou enterro - e tampouco seria comum um outro Ka preto subindo a rua justo naquela parte. Eu não tive dúvidas de que eram seus pais que iam ao centro comprar algo no mercado. Plausivelmente, eram eles. Com um elevado senso de humor, qualquer brincadeira seria esperada daquele automóvel que vinha ao meu encontro; e não tardou para que ele fingisse me atropelar. Eu, querendo ser simpático, me empolguei e...

Eu me empolguei e fingi que acreditava seriamente que seria atropelado, de brincadeira, claro. Primeiro, parei de caminhar bruscamente e botei as duas mãos esticadas para frente, com cara de pavor. Não adiantando, fingi (humilhantemente) que estava fugindo, virando 180º e subindo a rua por alguns metros desesperadamente rápido. Após, achei que estava entendido que participei da brincadeira. Me orgulhei de meu senso de humor aguçado! E quando me virei de novo, o carro desviou de mim calmamente e eu pude ver os rostos de dois jovens e uma moça (a motorista) rindo exaustivamente de mim. Ok, eles deveriam ser os primos dela. "Calma, nem tudo está perdido... eles vão reconhecer teu senso de humor".

Com a maior fé do mundo, acreditei que seria alguém da família que desconheço, e fui andando em linha reta em direção à garagem dela, pensando "não esteja, não esteja, não esteja!". E lá estava o Ford Ka preto, completamente estacionado dentro das grades ameaçadoras, com uma cara de besouro muito mais acentuada, como se olhasse para mim e dissesse:

"kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk"

sábado, 14 de março de 2009

Doce Ilusão

Eu era um jovem de recentes dezoito anos que cursava filosofia na faculdade de São Fischer. Todos os dias úteis, gastava quarenta minutos e exatos seis reais diários em transporte coleivo. Nada que me causasse muito estresse - é fácil acostumar-se com o inevitável. Chegando ao curso, nada senão grandes e incompreensíveis pensamentos humanamente inúteis. Na saída, entretanto, divertia-me observar o comportamento dos ditos cidadãos legais. Meus colegas fumando, ainda que soubessem desde crianças que seus pulmões estavam sendo pulverizados; algumas meninas trajando uniformes sexuais que muito me interessavam; adultos apressados que sequer imaginam quão logo descansarão obrigados pela mesma natureza que hoje desprezam - a mais justa das vinganças; velhos, uns esperando o fim chegar, outros iludindo-se. Citaria os mendigos, mas não são cidadãos. Por fim, eu mesmo, um jovem parado em frente a um edifício, observando semelhantes como se não fossem tais. Sentia-me um idiota e fechava meu ciclo, que sempre me perseguia. A ideia de fazer sempre as mesmas coisas em dias diferentes deteriorava meu cérebro.

Não obstante, seguia para mais um banquete autofágico nas ruas tumultuadas da cidade em um belo dia chuvoso de agosto. Lembro-me bem de chegar à faculdade apressado, devido ao atraso do ônibus. Era então segunda-feira e tive de esperar pelo segundo maldito sinal. Quando entrei, o professor saía com olhares tentadores - ah, se eu portasse uma arma! Meu amigo, Golias, de um metro e noventa, apressou-se a vir até mim. Agradeceu-me pela carta e passou a chamar-me de Nostradamus. Como de costume, não o compreendi, sorri e ignorei cada palavra. Todos os dias do mês tinha me agradecido por algo que não fiz. Dizem que ele me inveja, mas não vejo possibilidades ou motivos; ninguém inveja pouco. Segui assistindo à sequência de ideias coloridas até o fim da tarde, quando o último sinal soou. Liberado, observei as pessoas enquanto aguardava na parada, como de costume. Havia uma senhora segurando um poodle em suas mãos enrugadas, aguardando ao meu lado. O cão latia muito. Aquele berro agudo penetrava meus tímpanos e levava consigo minha audição e alegria. Aos poucos, fui tornando-me um poço de ódio e estresse. Ele não parava. Eu não suportava tamanho incômodo. Ele seguia latindo. Para, para, por favor, para. Ele continuou. Para, para, PARA! ... ele parou. A velha e o próprio cão me olhavam fixamente, como se o culpado fosse eu. "Quem é o culpado?", pensei, mas eles alinda me olhavam fixo. "O que foi?", perguntei em tom grosso e alto, mas ambos sequer piscaram. Algo estava errado; não moviam um só músculo! Se não houvesse o cão, teria fugido antes que aparecesse alguém, mas não, não estavam mortos, nenhum cão morre a gritos, embora as pessoas vivam insistindo. Aproximei-me. Nada; acariciei a cabeça do animal, e o próprio sequer se mexeu. Foi quando notei o extremo silêncio ao meu redor. Virei-me e caí sentado: todos os carros, pessoas, animais e até árvores estavam parados, como em um jogo de vídeo-game. Eu estava começando a enlouquecer.

O sol aparecia novamente e nada mais acontecia. O tecido da minha roupa me deixava agoniado. Pronto. Essas eram as únicas sensações externas que eu percebia. Em minha frente, dezenas de automóveis totalmente imóveis, como gelo, tais quais os motoristas. Aproximei-me de um fusca... "não, logo um fusca?". Andei um pouco mais e deparei-me com uma bela BMW que jamais havia antes tocado. A mulher que o dirigia olhava para a traseira do vectra que estava à sua frente. Eu abri a porta à direita e sentei ao seu lado. Toquei seu rosto - estava quente. Segurei sua mão. Ela estava totalmente vulnerável. Saí do carro e andei pela longa avenida. Todos continuavam em repouso. Poucas vezes me perguntei o que estava acontecendo; a ideia de ter o mundo só para mim estava tapando meus olhos por muito tempo... e por falar em tempo, o relógio! Ele maracava 18h53min, havia vários relógios assim. Sim - estavam parados. O tempo, o mundo e sabe-se lá o que mais estavam completamente parados.

Eu começava a entender que não entendia. Enquanto isso, arrecadei uma boa quantia de dinheiro alheio e guardei tranquilamente nos bolsos. "Será que podem me ver?". Ainda assim, não me achariam quando tudo voltasse ao normal - e pela primeira vez, senti minhas entranhas se contorcendo: e se não voltasse? Para que serviria o dinheiro em um mundo onde só - e totalmente só - eu vivesse? Como eu suportaria passar a vida com estátuas humanas? O que afinal estava acontecendo? Passei por um mendigo que dormia. Ele jamais saberia o que lhe aconteceu. Deixei exatos R$ 300,00 em seu bolso imundo. "Espero que saiba usar". Eu poderia ter tudo que fosse material. E foi o que me motivou a entrar nas lojas de entretenimento. As possibilidades eram tantas, que até perdi o interesse. Fui comer algo. Ah, isso sim, jamais me deixaria desinteressado! Comi todos os chocolates que encontrei. Podia apostar que a empresa não sentiria um centavo de diferença. Foi então que abri todas as embalagens da prateleira. "Agora sim", pensei, pois não havia ninguém para conversar.

Não havia ninguém para conversar.

quinta-feira, 12 de março de 2009

A Bicha Importante

Vocês já tiveram a sensação de estarem sendo observados?

Pois bem, este post não tem nada a ver com a frase acima, mas eu achei interessante iniciar com tal impacto. Minhas entediosas férias trimestrais estão chegando ao fim com um ano extremamente delicado (talvez o mais importante de minha vida). Os planos são claros: abrir mão de tudo; banda, amigos, festas (me refiro aos encontros mensais nas casas alheias), bom, tudo isso e mais um pouco deve entrar em recesso por um ano. E em um desses dias chatos e monótonos em que a espera é mais ardida que cachaça fervida, fui acordado às oito para entregar alguma coisa para meus pais em uma construção em Porto Alegre. Após centenas de orientações, calcei os tênis e me dirigi ao carro podre de trabalho deles. Fui e voltei em uma hora e pouco. Pela tarde, tive de passar em um banco perto do Pronto Socorro. Para tanto, levei minha namorada, primeiro por apreciar sua companhia, segundo por não fazer ideia até então de como chegar aoPronto Socorro. Com sua ajuda, cheguei lá suado, sujo e com aparência desprezível.

Ao adentrar, o segurança me encarou, do outro lado de uma parede de vidro, com um olhar de desprezo e ódio que resumiam uma frase subentendidamente clara: "Eu tô de olho em ti, seu pivete maloqueiro". Lembrei-me de meu estado caótico e compreendi-o. Precisava fazer um depósito, então minha namorada - mais vivida - pegou um envelope e botamos o dinheiro dentro.
Atrás dele, a única coisa que dizia era Nome do Requerente (ou algo assim) e Data. Não tinha, no entanto, uma caneta sequer. Através da parede, pude perceber que aquele segurança que me encarava possuía uma caneta em seu bolso da frente, e pus-me a solicitá-la. Passei pela porta giratória (já ia escrever roleta) e falei algo sobre a caneta, mas ele fez um gesto bravo com a cabeça, como se não tivesse entendido. Eu repeti claramente: "Não tem caneta ali, o senhor pode me emprestar a sua?" e ele, totalmente contrariado, retirou devagar sua caneta do bolso e me entregou com desconfiança. Voltei para a sala de entrada, onde ficavam as máquinas e envelopes. Encarei o envelope novamente com toda a minha inexperiência bancária, após diversas perguntas à namorada (que também estava perdida dentro daquele banco totalmente alternativo). Quando estava decidido a procurar outra forma de depositar aquele papel sujo e valioso na conta que tinha anotado no bolso, apareceu uma figura totalmente alegórica do nosso lado. Era um "homem" de prováveis 30 anos, loiro, estatura média e uma voz e aparência COMPLETAMENTE CINEMATOGRÁFICA. Sim, era uma bicha. Mas uma bicha de respeito; trajava terno e gravata - era o provável gerente, ou algo importante lá de dentro. Sua simpatia me assombra até hoje; surgiu do nada com o maior sorriso que conseguia estampar na cara e perguntou em um tom alto, claro e gay: "Vocês precisam de ajuda, né?" e eu, desesperado, respondi na mesma hora: "Sim!", o que o fez rir descontroladamente. "E o que é que precisam?"

Bom, após mostrar-lhe o envelope, perguntei o que era para fazer, e ele disse convicto: "é só botar o teu nome aqui e a data. Por favor, não-esquece-da-data!" e eu sequer me perguntei o porquê. Preenchi tudo e um canhoto extra que ficaria comigo. Ele pegou o meu envelope para ensinar a destacar a fitinha. Nesse momento, uma senhora pediu informações sobre o mesmo envelope, e ele pensou que o meu era o dela, oferecendo-a o dinheiro que eu já tinha colocado ali dentro. Após, fez gestos e risadas gays para explicar que tinha se confundido. Aceitei tudo por conveniência e fui devolver a caneta ao segurança, que me olhava com um sorriso irônico. Perguntei ao gerente gay onde era o buraco de depósito, e logo obtive sua resposta. Fui até o local e enfiei o envelope. Com muita gana em sair daquele ambiente fresco (em todos os sentidos), fui em direção à porta, quando minha namorada perguntou "peraí, e o número da conta?". Me senti um tremendo retardado.

Sabe aqueles momentos em que a pessoa se abstém do orgulho e, por mais que saiba de seu leito (que é fazer papel de imbecil), vê-se obrigado a seguir em frente e ignorar tal fardo? Bom, devido às circunstâncias, vi-me sem saída e retornei, esperando a bicha parar de atender qualquer um que estivesse perdido (todos). Quando ele me deu a palavra, expliquei meio gago que havia esquecido de pôr nome, e antes que completasse a frase, ele me cortou: "Ok, ok, qual era o procedimento? O que tu queria?" e eu respondi "Depositar aquele dinheiro pro meu pai!". Ele sorriu meio angustiado e com vergonha por mim, e falou que iria pedir para alguém que trabalhasse ali dentro retirar o envelope de lá. Depois disso, entrou porta giratória adentro, mas em vez de resolver meu problema, ficou uns dez minutos no telefone. "Bicha maldita", pensava, mas nada dizia ao lado da minha namorada, que me convencia, impaciente, a ir falar com ele. Também ela me lembrara que o canhoto tinha ficado comigo. Como eles saberiam qual era o envelope certo?

Com preguiça e muita impaciência, fui obrigado por ela a ir atrás da bicha (no bom sentido). Ao me ver chegando, dispensou quem quer que fosse do telefone e veio até minha direção, passando pela porta giratória e dando a notícia que a moça já viria. Tão rápido dizia isso, a porta giratória o fez saltar uns dois passos quando bateu com força em suas costas - ele havia parado na frente dela, já que eu estava indo ao seu encontro. Tentei conter o riso ao ver uma bicha loira e arrumada sendo lançada para frente com muita dor, mas então ele conseguiu me extrair gargalhadas ao dizer "Ok, ok, eu sou burro; fui atacado por por uma porta!". Cara, isso parecia um filme americano, tipo Gaiola das Loucas, mas um pouco menos Glam. Após esse acontecimento ilustre, apareceu uma mulher tão simpática quanto a bicha importante - velha tática dos bancos privados - com uma pilha de envelopes na mão. Sem questionar nada, localizei o envelope pelo nome e agradeci em voz baixa. Retirei a porcaria do dinheiro lá de dentro e a bicha já vinha me dando informações. Ao retirar o envelope correto (que se encontrava na máquina), lembrei que tinha devolvido a caneta para o segurança. Que preguiça de viver.

Quando ia atravessar mais uma vez a maldita porta giratória, a bicha perguntou o que era, falei sobre a caneta e ele me deu a primeira notícia boa do dia: "não precisa, pode fazer tudinho pela máquina!" e sorriu alegremente. Agradeci e fui ter com a máquina. Puxei o papel do bolso e, junto de minha namorada, tentei desvendar o mistério dela; e após concluir (muito tempo depois) todas as operações, o barulho e uma informação na tela me fizeram crer que era hora de depositar o dinheiro em algum dos 50 orifícios daquele gabinetezinho mal-feito. Tentamos em todos, com muita calma, até que... "OPERAÇÃO CANCELADA. FAVOR TENTAR NOVAMENTE".

Não gritei; apenas obedeci. E com muita raiva, repeti tudo com rapidez, e levei pouco menos tempo para achar o buraco certo e finalmente depositar aquele pacote de papel moeda que tanto me envergonhou. Quando acabamos, a fila ao lado era imensa e a minha estava vazia - prova de que demorei tanto, que as pessoas optaram por esperar os outros. Para finalizar minha saga, me despedi da bicha, do segurança e de algumas pessoas que já acompanhavam minha epopeia de perto. A bicha falou de longe e bem alto "Eu sei que isso tudo foi só para vocês curtirem o arzinho gelado daqui de dentro!" e eu respondi algo simpático, apertando o passo até a porta de saída. Nunca me senti tão bem ao receber o bafo fervente e úmido do centro de Poa no mais quente verão sulino.

PS: eu nunca mais volto lá.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Vagina de Aluguel

Como a ideia de criar este blog já é tão antiga quanto a preguiça de fazê-lo, já havia criado meu primeiro desabafo em Agosto de 2008. Não posso deixar de compartilhá-lo, ainda que comigo mesmo. Considere as datas ultrapassadas.

"Há duas semanas, venho sendo assediado. Todos os dias. Este fato lamentável tem hora, local e motivo: 10 e meia da noite, Centro de Poa e DINHEIRO. Não, eu não tenho dinheiro. Sim, se trata de prostitutas.

Tudo começou com a minha inocência metropolitana, onde puta é puta, pato é pato e colono é colono. Meu Deus; as putas da Cel. Vicente são agentes do diabo! Vinha eu, voltando da longa jornada diária (que começa às 8 e acaba meia noite), após as aulas acabarem, quando chego até a esquina da independência e penso o que diabos fiz na ida, quando o caminho parecia mais fácil. Meus olhos abriram o sorriso que a boca poupava às ruas gélidas, e concordei que era obrigado a descer a bendita rua. E até então tudo bem, tirando o fato de quase ter virado salame italiano no asfalto, quando atravessei a Alberto Bins sem olhar. Acho que mereci aquela buzinada (mas se tu estiveres lendo isso, enfia teu Celta branco no CU).

Então segui minha descida, ainda desligado - pensando na cena anterior - e tão desligado que meus olhos trabalharam sozinhos, ao verem uma mulher parada na esquina com aquelas calças em que até um babuíno de bunda vermelha fica gostoso, dotada de uma postura ereta, cabelos morenos extremamente lisos, uma aparência normal - o que hoje é raridade - e, o que não fora percebido, com muita maldade no corpo. Percebeu, antes de mim mesmo, que minha visão acidentalmente a contemplava - para sua alegria; era como se a gazela encarasse o leão. A única característica anormal - a mais óbvia de todas - era o fato de ela estar parada, sozinha, em uma esquina do Centro de Porto Alegre às 10 e meia da noite. Não, isso não me chamou a atenção.

Num baque mental, meus pensamentos foram interrompidos com uma frase árdua, pronunciada com uma voz suave e doce; uma contradição totalmente inesperada. Deus sabe o quanto meu coração acelerou - muito mais que quando da buzinada - com o seguinte vocativo:
"- Oi, quer fazer um programa?"
Congelei. Como assim, um programa? Que frase mais ambígua! Como ousava aquela mulher normal dirigir a mim uma pergunta tão complexa? Sinto muito, meu leitor; eu passei reto. Mas voltei no segundo passo. Destemido feito um Poodle albino, dei três passos para trás para tirar informações.

- Depende, como que funciona, querida?
- Onde tu prefere?
- Na tv Globo, é óbvio.
- Oi?

E saí andando, rindo sozinho, orgulhoso como uma gazela que humilhou o leão. Mas notem: ainda sou uma gazela (analogias gays à parte, por favor!). Eu não esperava que a Indústria da Safadeza era tão organizada. Ao descer um pouco mais, senti um puxão no braço seguido de um elogio completamente infundado: "vem cá, gatinho", dizia uma loira farta e apelativa. Ela ganhou - saí acuado feito uma gazela perneta. E 100% ofendido. Minha vontade era voltar e indagar: o que torna o dinheiro tão precioso, quando a horna é vendida? De que vale o arroz, quando o seu feijão é dos outros? (agora sim, façam as analogias que quiserem). "Tudo bem", pensei, "cada um com seu redondo". Ri de tal trocadilho e segui até o fim da rua. Lá, a claridade dos postes e dos ônibus me deram o sabor de casa com o famoso cheiro viamonense. Minha mente estava cansada e torturada; sangrava pudor e arrotava medo. "Eu-sou-uma-gazela", pensava. "Eu sou uma gazela, eu sou uma gazela, elas são leões e eu so uuma gazela, eu sou uma gazela, eu sou uma ga..."
- Vem aqui, meu amor - putiou uma terceira voz à qual sequer olhei:
- TÁ BOM, EU DESISTO, ME LEVA, ME COME, ME ABUSA, SÓ NÃO ME COBRA MUITO CARO, PELO AMOR DE DEUS!

(Pausa dramática)

- Que isso, meu filho! Só queria saber as horas! - disse a tia das pipocas.