segunda-feira, 20 de junho de 2011

A Todo Mundo, a Todos os Meus Amigos

Taia: obrigado por me mostrar que ninguém é totalmente feliz. Apesar de tudo, te perdoo. Escrevo essas memórias em teu nome, e as primeiras manchas de tinta que encontrarás serão o fruto das últimas lágrimas que por ti derramei.
Mãe e dinda: perdão por causar mais esse desgosto. Mas prometo que será o último.
Daniel, Alex, Pietro e Márcio: enquanto estiverem lendo isso, meus amigos, saibam que eu adoraria poder ficar junto de todos vocês. Sorriam quando se lembrarem de mim; o meu corpo já se foi, e isso é tudo.

Alguns hão de pensar que faço isso por amor; outros, por covardia. Mas vos digo: covarde é aquele que se conforma com sua dor por medo de confrontá-la. Hoje eu venci minha dor; e vocês?

O fato de eu amar a Natália mais do que a mim mesmo não me levou ao suicídio. Juraria por Deus, se n'Ele ainda acreditasse. Não; eu amo e morrerei amando essa mulher, e isso só me deu forças para tentar seguir em frente; ela foi a esperança das minhas noites na escuridão, a chama acesa sobre a vela dos meus dias; e antes que suponham tê-la apagado uma brisa forte soprada da janela, acreditem: ela simplesmente derreteu até a base.

Uma vez o Daniel me disse que a pessoa só se suicida quando a dor é maior que a esperança de curá-la. Eu discordo. A dor que sinto hoje - e que venho sentindo há quase três anos - pode ser mascarada com drogas, ou com confissões, mas não é para isso que serve a dor: é para nos avisar; como quando nos dói o dedo na chama quente para que não nos queimemos, e o pulmão sob a água fria para que não nos afoguemos... da mesma forma nos dói o coração, para que não mais o castiguemos. E o seu castigo, para mim, é deixá-lo bater pelo motivo que bate.

Eis, é por isso que me vou. Os que bem me conhecem sabem que, desde que me recordo, procurei incansavelmente o motivo da minha existência, a razão de continuar vivo. Concluem vocês, pois, que fracassei - mas pelo contrário, eu consegui. Durante esses últimos meses, descobri completamente o mistério que envolve a humanidade, a resposta para todos os porquês! Não me restam dúvidas de que estou certo, e vejo agora com a mesma clareza com que vês uma maçã cair duma árvore; vejo-me no espelho e enxergo meu futuro, meu passado e minha data de óbito estampada em minha testa, a doença que haveria de carcomer meu fígado amanhã, as lágrimas que haverias de arrancar de outrem; Taia, amigos e quem me estiver lendo: eu descobri o motivo pelo qual estou vivo; logo, calo-me e parto, e se faço isso em vosso nome, é para poupá-los de um futuro insano e amargo que, ou os levaria à morte, ou os levaria ao manicômio.

Meus pertences devem ser devolvidos aos meus pais; os meus cadernos de composição devem ser entregues ao Daniel - ele saberá o que fazer. Quero que rasguem minhas fotos e que formatem meu computador; não preciso continuar vivendo senão na vossa memória. Enterrem a Lassie perto do meu antigo quarto; digam a ela que sempre a compreendi; ela entenderá melhor que muitos de vocês. Que minhas roupas e todos os órgãos possíveis sejam doados a quem lhes convier. Minhas senhas e contas de toda a minha vida virtual e financeira estão na caderneta que guardo na segunda gaveta do bidê. Encerrem tudo que for meu o mais breve possível, pedindo a ajuda do Daniel no que for preciso. Quero ser cremado, mas por favor, não guardem minhas cinzas; joguem-nas onde acharem conveniente. Não permita que estranhos assistam à cerimônia, que por mim poderia não existir, mas entenderei seus motivos de homenagear um ser em decomposição. Evitem chorar por mim...


Não saio dessa vida por amar ou por sofrer demasiado, mas por compreender demasiado, e, portanto, feliz.
A todo mundo, a todos os meus amigos: eu vos amo, mas tenho que partir.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

O Humor Ataides

Meu pai nasceu com um talento notável para o humor, mas infelizmente a vida o levou para outro canto. Ainda assim, o dom desse sujeito constantemente aflora em momentos do dia em que ninguém espera.

Por exemplo: acabo de voltar da cozinha. Enquanto preparava uma batida, minha mãe desesperou-se quando faltou o gás do fogão, e então falou:
- Tem que ligar pra pedir gás! - tendo meu pai respondido:
- Liga.

Ligou a própria, tendo eu ouvido sua conversa do lado.
- Oi, eu gostaria de "dois gás"...
E meu pai, com a boca cheia de vinho, fez uma careta e um sinal com a mão de baixo para cima. Ela, submissa e cautelosa, disse: "só um pouquinho" para o homem do gás no telefone e perguntou:
- Tu quer mais?
- Sim...
- Tu vai ter dinheiro?
- Eu SEMPRE tenho dinheiro.
Então ela pegou o telefone novamente e completou:
- Me vê "três gás".

E meu pai sabiamente olhou para o chão, dizendo baixinho:
- Bah, pra três eu não tenho, tenho só pra dois e meio...

terça-feira, 14 de junho de 2011

Mijelado

Ontem à noite, convidei meus amigos Diogo, Alemão e Marcelo para irem lá no apartamento tomar uma tequila e umas cervejas, para depois irmos no Beco.

O que não aconteceu, pois, depois das cervejas com tequila, o Diogo foi parar na minha cama, e o Alemão se atirou no sofá. O Marcelo e eu ficamos na internet por uns quarenta minutos, quando resolvemos acordar o Diogo e o Alemão.

Deste modo, Marcelo acordou o Alemão, na sala, enquanto eu acordava o Diogo, no quarto. Após minha missão ser cumprida, dirigi-me até a sala e notei algo de diferente: a porta da cozinha estava fechada - mas eu jamais a fecho. Assustado, abri a porta e a cena que vi foi meio atípica: o alemão de costas, com a porta da geladeira aberta. O difícil mesmo foi associar tal cena com o efeito sonoro ao fundo.

- Alemão! O que tu tá fazendo aí?!
Então ele virou só a cabeça e disse, com ar de quem tem razão:
- Sai, to só mijando.

Sim, o filho da %$#& estava urinando na minha gaveta de verduras. Eu o sacodi enquanto gritava, e ele finalmente "acordou". Eu controlei meu instinto alcoólico o máximo que pude, mas não consegui evitar e parti para cima do infeliz, que, parado, olhava-me sem compreender, tendo eu sido segurado pelo Marcelo.

Botamos o mijão para limpar por duas horas a porcaria da geladeira. Enquanto isso, eu fui para meu quarto e, por muito tempo, chorei desesperadamente, oscilando momentos de gargalhadas profundas.
Um dia depois, recebi por email suas desculpas, e a resposta foi mais ou menos a seguinte:
- Tu é o único cara que conheço cuja primeira namorada usava três calças, que já passou merda de gato na cara da segunda namorada, que já foi atropelado por uma vaca, que já recebeu molho de cachorro-quente nas mãos e agora mijou na minha geladeira. Acha mesmo que vou deixar de ser teu amigo e perder a próxima?

Ah, seu alemão de mijo! Ainda vou contar isso para teus filhos.

domingo, 5 de junho de 2011

Hacia Uruguay (Primer Día)

 Aí está o relato da viagem ao Uruguai, primeiro dia, escrita boa parte em tempo real. Abram aspas:

Acabamos de chegar em território uruguaio e as coisas já ficaram espertas: a senhora da imigração não foi com a minha cara e, uns 50km após, resolvemos dar uma paradinha na cidade de Vergara - basicamente um vilarejo acidental. Os habitantes são feios e tímidos, e não sabem dar muitas informações. Procurei ser bem claro e educado, como todo estrangeiro deve ser, e depois de algum tempo rondando a minúscula cidade encontramos o que bem poderia ser o único restaurante da cidade.
A senhora dona não parecia ser feliz. As duas mesas livres (não haviam nem dez no recinto) estavam sujas. Depois de rondarmos de pé esperando orientação, percebi que esta não viria, então tomei a frente e perguntei à senhora dona "como se fazia para... comer". Juro que essa foi a pergunta. Ela me olhou meio aborrecida e falou "só toma um assento e espera". Tomei aquilo como um conselho e orientei os companheiros a sentarem-se na maior mesa suja. Esperamos por volta de 15 minutos e ninguém veio nos atender, sendo que passavam por nós direto sem nos olhar. Até que tivemos a brilhante idéia de perguntar se eles aceitavam reais, já que não havíamos feito o câmbio ainda. E surpresa: não aceitavam. Até com a gerente falei (ou algo próximo disso). Atravessamos a rua e fomos numa venda na qual o senhor era mais simpático e de certa forma até meio gaudério; "buenas", me disse. E me ganhou aí. Então perguntei se aceitava reais e ele disse que sim. Até me informou do câmbio, o que me deixou muito feliz. Só não comprei nada porque não queria mesmo, mas os guris compraram alfajores. Por algum motivo, surgiu uma suspeita entre nós de que os cavalos é que dominam as pessoas nessa região, quando passamos por cavalos que usavam roupas. Isso explicaria a infelicidade da população em geral nesse vazio fronteirístico. E para a nossa felicidade, quando pegamos estrada novamente, vimos uma "carroça ao contrário" - um carro levando um cavalo muito robusto. Tirem suas próprias coclusões. Agora estamos esperando alguma outra cidadela surgir no mapa em direção a Montevidéo para comermos algo, mas pelo que calculo, não estamos nem perto do centro do país, cuja capital se situa na ponta oposta.
Após chegarmos na cidade Treinta y Tres, localizamos um restaurantezinho "loco de especial", que teoricamente vendia pancho e carnes. Nos atendeu um casal de velhinhos simpáticos e de aparência muito suja, tanto quanto o ambiente. Logo faziam graça por perceber nossa nacionalidade, e sugeriu que no lugar do pancho comêssemos uma de suas carnes; "que carnes o senhor tem?", disse eu, ignorando o frango sujo e rodeado de moscas no qual o homem tocava com as mãos nuas, dizendo "pollo!". Acabamos pedindo um pancho, mas mais uma vez lembramos do dinheiro, e ele não quis aceitar. Triste, mas verdadeiro. Ao sair, o Floriano comentou que tínhamos acabado de nos livrar de quatro doenças diferentes. Não sei se de quatro, mas com certeza não comer aquilo foi a coisa mais saudável que já fizemos no dia de hoje.
Chegamos em Montevidéo pela tardinha, já anoitecendo. Foi quando percebemos que não tínhamos o endereço do Hostel, tampouco uma idéia de onde consegui-lo; nas ruas, não conseguíamos encontrar wi-fi, e então paramos num posto para pedir informações. Depois de muito trabalho, meio sem saber como fazer, Pablo conseguiu um sinal wi-fi, e achou o endereço do hostel; com o GPS, chegamos lá em 20min.
O hostel era bem menos interessante do que parecia; o quarto continha cinco beliches, mas nessa noite de sexta a única pessoa que dormiu nele além de nós era uma uruguaia bem distante. Depois de testar os banhos, bem quentes por sinal, fomos todos fazer a primeira refeição decente do dia no coração de Montevidéu - la ciudad vieja, um local histórico cheio de prédios muito antigos e monumentos legais. Pedimos um bife à milanesa com batatas fritas que estava bem saboroso. Voltamos para o hostel e tocamos um pouco de violão, eu e o Lucas, e mais tarde resolvemos sair, lá pelas 23h, para conhecer a vida noturna uruguaia. "Bad mistake", como dizia o guia chileno de Santiago; as ruas estavam absolutamente desertas - e isso era na parte turística da cidade -, os prédios pareciam desabitados e os pontos comerciais estavam fechados. Sim, sexta de noite. Então começamos a andar. E andamos...
Após horas de caminhadas, conseguimos comprar uma cerveja muito além do Teatro Solis, depois de passar pela praça da Independência, cujo monumento é magnífico e gigantesco. Somente algumas horas depois é que dobramos na rua "certa" e encontramos meia dúzia de bares, dentre eles o famoso Ponei Pisador. Isto foi o máximo de gente que a gente viu: umas 50 pessoas. Meio decepcionados, entramos em cada um dos bares para verificar se não havia uma milagrosa reunião de uruguaios, e... não aconteceu.. Mais tarde, entramos no ponei. Algumas latinas dançavam loucamente uma mistura de cumbia com salsa, mas todas acompanhadas e a maioria das pessoas era mais velha. No pub irlandês, uma ótima trilha sonora nos pegou de surpresa: até eguinha pocotó, nos fazendo sentir orgulho de ser brasileiro. Depois, uma versão uruguaia de "Ilha do sol" (?) do Netinho nos fez sentir em casa. Quando demos uma voltinha, encontramos um outro pub no qual algumas uruguaias novas e feias nos orientaram a não entrar, indicando um que seria "mais a nossa cara", chamada La Bonita. Chegando lá, vimos que era uma casa noturna meio legal até, mas quando tentamos entrar, a surpresa: "levantem os sapatos por favor", disse o segurança careca e gordo. A gente ficou meio "que merda é essa?", e ele insistiu... no fim, barrou o Pablo porque ele estava de Nike Shox. No início pensamos ser piada, mas ele não sorriu por tempo o suficiente para mudarmos de ideia, e então nos explicou que lá quem usa este tênis é mal visto, e desde que proibiram o histórico de confusões foi reduzido; que entendia não sermos de lá, e que poderíamos ser boas pessoas, mas que não poderiam mudar as regras. Depois, trouxe uma loira explêndida para nos convencer a voltar lá no dia seguinte com outro sapato. De fato funcionou.
A noite meio que terminou conosco voltando ao hostel com um sentimento de esperança. Pelo dia seguinte, porque este noite foi meio desestimulante...

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Fantasia Estúpida de Homem

Quando eu olho a imensidão de um céu estrelado numa madrugada de outono, um dilema crucial toma conta do meu pensamento. Ou eu aceito minha ignorância - o que seria inteligente -, ou eu aceito Deus - o que seria ignorância.