domingo, 26 de julho de 2009

Gripe do Presunto


Um espirro
já basta para que eu saia de perto de ti. Jovens me amedrontam só por viverem, estando ou não com suas caras abatidas durante a manhã gélida da cidade de Porto Alegre. Sou um pouco hipocondríaco - descoberta recente - e, enquanto não me adequo àquelas máscaras ameaçadoras (que fazem até Jesus te olhar desconfiado), procuro simplesmente evitar pessoas suspeitas: quase todas.




DELICADO, Suíno - Modelo e Ator Pornô

Hoje, estou totalmente convencido de que contraí essa safadeza. Isso - perguntarias em breve - se deve ao seguinte acontecimento:

Estava eu dentro de uma lotação fechada, às 12h, no meio da semana, em direção a Porto Alegre. Logo na saída do condomínio, uma senhora em estado putréfico havia entrado, segurando sua bengala maltratada, e, antes mesmo de pagar, começara a tossir feito uma suína. Sua cara parecia mais defunta do que a de um cadáver fresco, e tinha uns prováveis 50 anos, mas seu estado era caótico, e sua saúde era de enfermo terminal. Assustei-me; como, diabos, irei suportar uma viagem fechada com um cadáver vivo? Quantos tipos de doença poderia pegar, não pensei bem, mas a possibilidade de contrair o H1N1 me proporcionou desespero. Como sempre atraísse tais coisas, a senhora, que tinha diante de si um ônibus vazio para escolher, sentou na coluna do meu lado, e só um minúsculo corredor me separava da gripe do lombo. Em sua terceira tosse, contudo, levantei-me e fui até a extremidade contrária da que ela estava. E fiquei lá, na traseira, até lotar a pequena condução.

Lotara e, por sorte ou por azar, os únicos dois lugares que sobraram estavam em minha frente e ao meu lado direito. Não tardou muito para que subisse um casal. Oh, mas que tristeza! Não havia dois lugares juntos... mas, querido, olha lá do lado daquele moço: tem dois pertinho! Tudo bem, pensei. O superego ainda monta o egoísmo. E, fingindo não se importar, concedi as licenças de modo que o jovem sentasse ao meu lado, e a jovem à minha frente; no entanto, deram-se as mãos do início até o final da viagem. Procurando ignorar, aberto o livro diante de meus olhos, abstive-me por alguns segundos, e o teria feito por mais, não fosse o detestável espirro que o rapaz deixasse escapar. Além de notar as partículas Tipo A que se difundiam por todo o clima asqueroso daquele transporte, a força e o barulho com que aquele corpo cavalístico havia soltado o espirro foram suficientes para, hiperbolicamente falando, "balançar o busão".

Disfarçadamente, devido à delicadesa da situação, cobri minha respiração com o casaco que vestia, até não aguentar mais tamanho auto-cuidado. Ao desproteger-me, e sem ter para onde fugir, senti-me vulnerável a quaisquer porcos que voassem ali dentro e já me sentia doente lá mesmo. Entretanto, 'a desgraça nunca vem sozinha', e o sujeito passou a ter uma crise de espirros avassaladora. E a cada espirro, menos esperança eu tinha de sobreviver àquele incidente terrível.

Depois de me libertar, pela primeira vez tomei o ar poluído de POA com muito prazer, quase como sinônimo de saúde e de liberdade. No longo caminho que percorro a pé do viaduto à Alberto Bins, dei de cara com uma senhora que vinha na direção contrária, utilizando aquelas máscaras aterrorizantes, e isso me fez sair da calçada tênue e delgada para evitar que trocássemos o mínimo possível de ar. Pisei por alguns poucos segundos no meio da rua, até que ela passasse, mas esse minúsculo tempo que utilizei para minha saúde, ironicamente, quase me a tomou por completo, fato que se provou no mesmo instante que ouvi um senhor (que vinha atrás da senhora gripada) aos berros tentando me avisar o seguinte:

- CUIDADO COM O ÔNIBUS GURI!

Pulei para dentro da calçada na mesma hora em que uma lotação atropelava com fúria o espaço de ar em que eu me encontrava. Ainda na calçada, tive tempo de passar exatamente ao lado da enferma senhora, que por sinal raspara seu braço doentio no meu.

*Lição do dia: "Antes pegar o suíno junto, do que virar um presunto"



Abaixo, "Os Desabafos de um Suíno", ganhador
de 2 Oscar e 1 Globo de Ouro.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Capitão Mosca (Episódio 1)

Tá aí uma nova série de minha autoria, espero que gostem, pois foi gravada com muito esmero.




quarta-feira, 22 de julho de 2009

Viagem Acidental

O objetivo era claro:
- Lucas, vai buscar teu irmão no aeroporto, já são quatro horas, e ele desembarca às cinco e meia!
- Já vamos, mãe - disse eu por mim e pela minha querida acompanhante nos programas-de-índio (e namorada nas horas vagas).
Preparamos as poucas coisas a serem levadas por mim: a carteira de motorista. Ela, uma bolsa com objetos inimagináveis, contendo inclusive uma câmera fotográfica. Fomos ao carro, e não demorou para que a tal câmera fosse retirada do conforto do ventre bolsal.

Logo na saída, quis dar uma de sabidão e disse-lhe que iria pela Freeway, "que é infinitamente mais perto". Estava claramente contando vantagem, já que omiti o fato de ter OUVIDO esse dado distancial, e tampouco lhe contei que havia feito o dito caminho na manhã anterior, seguindo meu pai em outro carro. Assumi, pois, a responsabilidade de levá-la comigo até a Freeway, em vez de ir pela Ipiranga, sem sequer saber onde entrar direito, nem para que lado ir. Meu senso de direção sempre foi... como se diz... muito ruim. Mas a despeito de tudo isso, minha fé era grande, e talvez possa ilustrar isso bem com uma das primeiras fotos reais deste blog, logo na saída de casa, em que a carona ia despreocupada, e o motorista, apostando em si.

Lá fomos nós. Pegamos a esquerda do condomínio: caminho muito vasto e rumo ao desconhecido. Como fizera na véspera, não me preocupava muito. Sabia que, mais cedo ou mais tarde, chegaria até alguma entrada e, após alguns minutinhos na Freeway, chegaria até o pedágio, e de lá seria "um pulo". "Um pulo"? "Um pulo" no espaço, talvez.

E depois de sair da RS-118, tendo certeza de que chegara à Freeway (mas aquela certeza cagada, se é que me entendem), entrei nela à direita: opção sem fundamento algum. E fui em busca do pedágio. Ainda na entrada, lembro de brincar, comemorando muito por estar na Freeway, ao ver uma placa da mesma. E a Paola despreocupada, tirando fotos no retrovisor, dizendo-se inovadora.

O problema é que o pedágio não chegava. E não é assim, "oh, mas que demora!". Eu andava a 120km/h, sendo constantemente xingado pela tal, mas realmente estava longe demais e não achava o dito pedágio. É preciso deixar claro que Viamão fica por volta do Km 78 da Freeway. Estávamos no Km 60, já, e nada acontecia. Dirás: "ora, só 18km e reclama!". Pois é, não reclamara até aí.

Acontece que eu não parei. Não queria acreditar que o pedágio pudesse ser tão longe assim; então comecei a correr. Dirás: "ora, mas 120km/h já era correr!". Pois é, mas passei a CORRER. cheguei aos 140, acabei em 160km/h, num risco de irresponsabilidade que me fez prestar mais atenção na estrada do que na própria respiração. E andamos por muito, mas muito mais tempo, e nada. Comecei a desconfiar de que estava errada a direção. Olhei para a quilometragem, únicas placas daquela maldita rodovia. Km 40 indicava que eu estava muito mais distante do meu destino do que eu pensava. Era hora de parar. Sob risos da Paola, paramos perto do primeiro SOS que vimos após tal quilômetro, idéia dela, já que jamais me questionara para quê serviria aquelas caixas azuis no meio da estrada. Infelizmente, concordamos depois, ela não tirou foto disso.



Nos dizeres do meio: Porto Alegre - 71km


Olhei bem para a caixa, que continha apenas uma placa metálica com um botão e uns riscos de onde saía o som. Senti-me uma criança decidindo se apertava ou não aquele maldito botão. Apertei antes de preparar o que ia falar.

- Serviço de Ajuda à Rodovia, boa tarde?
- Boa tarde.
- O senhor precisa falar mais alto, senhor.
- Boa tarde!
- Senhor, não podemos te ouvir. - nisso, literalmente colei meu rosto naquela placa gelada e gritei:
- BOA TARDE! EU VIM DE VIAMÃO, ESTOU NO MOMENTO NO KM 39, QUERO IR ATÉ O AEROPORTO, COMO FAÇO?
- O senhor está perdido? - típica pergunta-sacanagem. Era evidente que eu estava perdido - para não dizer fudido - e se eu não estivesse, não ligaria :(
- SIM, EU VIM DE VIAMÃO... COMO FAÇO PRA IR AO AEROPORTO?
- Meu senhor, o aeroporto é no KM 98.



(Foi então que olhei para ele bem assim -> )


DRAMÁTICO, Esquilo.
Ator internacional
- E o senhor está na direção errada.
- (caralho...) E COMO EU FAÇO PRA RETORNAR?
- O senhor tem que pegar o retorno no Km 25.
- MUITO OBRIGADO. - saí correndo, completamente envergonhado e com o orgulho, anteriormente descrito, totalmente destruído.

Entrei no carro e quase me neguei a contar. Dei a partida e... contei, porque sou um guri, e ela, uma guria. Eis que, alguns minutos depois, no Km 33, tirou uma foto, afim de comprovar a maldita jornada acidental.

Gente, eu queria ir ao aeroporto, Zona Norte de Porto Alegre. Fui parar na Zona Norte do Estado. Próximo, muito próximo das praias, do litoral. E tudo isso por conta de um orgulho masculino frágil e errante, que me custou um possível problema e preocupação: já eram cinco e dez: tinha 20 minutos para VOAR do Km 25 até o Km 98 sem ter de ouvir as mesmas coisas de sempre, e de toda a família. "- Apertem os cintos", disse para ela e para mim mesmo, velho
costume meu. Lá fomos nós, a 160km/h. Façam as contas. Com alguns deslizes no meio do caminho, como a polícia rodoviária atacando um outro carro (o que me fez gelar até o último dos seis dedos que tenho nos pés) (ok, é mentira a parte dos dedos) (digo, dos SEIS dedos), mas por volta de meia hora conseguimos chegar ao Km 98, quando minha mãe ligou.







Nos dizeres: Sto. Antônio,
Taquara, Gramado.




Eu, guri de apartamento, não sei mentir. Ela, fêmea, o faz com destreza. É por isso que atendeu o telefone, enquanto eu murmurava comigo mesmo: "tá, vamos falar a verd..."

- Oi, Teka! Sim, já estamos chegando! Isso! (risadinhas) Ta bom... beijo, tchau!
- Como tu diz que já tamos chegando? Recém entramos na parada!
- Ah, já tamos chegando, queria que eu dissesse o quê? (corrija-me se inventar).

Pela graça do destino, acertei de primeira todos os caminhos seguintes, incluindo a lomba grande e curva, parte que mais me amedrontou em toda a viagem. Chegamos 10 ou 15 minutos atrasados, e ainda tive de discutir com ela sobre subir ou não subir a lomba do embarque. Ganhei, já que estava dirigindo. Entrei então em um caminho que julgava o correto, mas para a minha surpresa, só havia carros iguais ali.

Outrossim, fora aí que ouvira batidas estrondosas no vidro do carro.

- LUCAS! AQUI É SÓ PRA TÁXI! - gritava meu irmão, pouco antes de entrar no carro.




Ao lado, provas concretas da crueldade gratuita feminina, coberta de incompreensão
e de sadismo, típicos da espécie.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Fatos Fodas (pt. 2)

Dando continuidade à minha saga diária, e sem mais demoras, não me demoro em continuar minha saga de cada dia.

(Em destaque, uma pintura de meu único ídolo das artes plásticas afora o Beco dos Guterres: René Magritte, em seu quadro que me lembra uma célebre passagem musical... Alguém arrisca qual? ALELUIA!)

3º - JUSTIÇA DE CANIBAIS

Eu estava às 10:30h em uma loja de máscaras, experimentando as máscaras mais alternativas que já vi em frente a um espelho. Tive, porém, que tirar a máscara de E.T. de Varginha (de cabeça inteira, perfeita!) quando ouvi berros e pessoas correndo. Pouco curioso, acompanhei o fluxo de gente até em frente ao Unificado, onde vi um bolo de pessoas, cujo diâmetro passava dos quatro metros, e uma poça de sangue escorrendo por entre os pés dos ordinários. Imaginei tratar-se de um acidente, sei lá, mas quando me aproximei bem, não precisei perguntar para saber que estava diante de mais um caso em que a justiça canibal julgara impiedosamente.

Um sujeito havia roubado o celular de uma moça. Esta gritou por socorro, e a população gaúcha se reuniu, formando uma rede inter-racial humana para circundá-lo. Fizeram-no, e após, peladaram-no, pisotearam-no, cospiram-lhe e, não negaria, estupraram-no com força. Sangue e marcas de luta viam-se por toda a parte. Pessoas assustadas e sorridentes, extremos comuns na sociedade porto-alegrense. Fiquei tentando ver o estado do homem.
Mas não consegui.


4º - APONTAR: FOGO!

Tomando banho no banheiro novo, um dos primeiros dias, senti um cheiro estranho de queimado. Concluí: é o chuveiro. Desliguei correndo e observei por muito tempo a fiação em cima dele. Concluí: não entendo de chuveiros. Percebi que ainda era forte o cheiro. Hora de uma explicação.

O novo banheiro da minha casa separa o novo quarto do meu irmão do meu novo quarto, ou seja, ambos temos uma suíte, mas o banheiro é o mesmo. Este abre por duas portas, que dão diretamente em ambos os quartos. É tudo que posso dizer até que me visitem.

Saí do box e fui ao meu quarto, ainda convicto de que algo estava embaçando. Brabo com os vizinhos, devido à avançada hora, resolvi, ainda enrolado na toalha, passar no quarto de meu irmão para questioná-lo do acre odor que difundia em minha humilde residência. Como não respondera à batida na porta, tomei iniciativa de abri-la. E eis a cena que eu vi lá dentro: --->


Juro, não poderia ter achado foto melhor. A cama do guri pegava fogo alto, quase até o teto. Certifiquei-me que ele não estava deitado nela (hehe?), e então pensei. É hora de outra explicação.

Eu tenho um sistema nervoso completamente desregulado. Por algum trauma desconhecido, ou lição de vida, enfrento alguns tipos de distúrbios emocionais que seguidamente me prejudicam, da seguinte natureza: quando algo MUITO GRAVE MESMO acontece, meu corpo não reage assutado, mas calmo; fico calmo, calmo demais, a ponto de poder dormir ali mesmo. Quando algo não muito grave está por acontecer, meu coração quase explode de tantos BPM. E foi na primeira situação que me encontrei ao abrir aquela porta.

Porém, pensei, está é a hora de se desesperar. E nada. Vamos, Lucas! A cama está em chamas! Mas nada, eu ficara segundos longos observando o fogo, com uma toalha pendurada entre as coxas. Tá, é agora ou nunca. Conscientemente ou não, deixei a toalha cair e saí gritando: FOGO NO QUARTO DO DIEGO, FOGO! FOGO AQUI!

Meus pais, meus irmãos e um vizinho (que não sei o que fazia ali) vieram correndo, com caras de apavorado. Este último arrancou as cobertas para fora, sufocando o fogo em poucos gestos. Meu pai e meu irmão botaram o colchão para fora do quarto. Minha mãe saíra correndo berrando sozinha, em busca de água e balde, que jamais chegaram. Em poucos minutos, tudo estava em ordem (leia-se: o fogo apagou-se), mas eu continuava calmo e com um pequeno detalhe:

Ainda estava peladão.


Sendo assim, concluo os quatro fatos que me tiraram do sério neste mês. Mas hoje ocorreu algo que... bom, aguardem.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Fatos Fodas (pt. 1)

Eu quero provar, com quatro fatos isolados, que é preciso ter muito cuidado, porque o mundo está acabando.

1º - O MENDIGO AZARADO

Aquele dia do chinês (que, a propósito, ainda não me adicionou...), no fim da tarde, quando esperava o ônibus para a viagem final do dia, um mendigo abordou-me na parada. Nunca vi tamanha cultura em um só mendigo.
- Boa tarde, meu amigo, olha só, eu não to aqui porque eu quero. Eu sou morador de rua, mas eu era trabalhador, eu catava lixo - nessa hora, botei a mão na minha lasergun, temendo um novo assalto imbecil. E antes de ele continuar, perguntei:
- Tá, peraí. Por que tu não cata mais lixo?
- É por causa do meu dedo... - e mostrou a mão. Caras, o arrepio que eu senti me fez sentir pelado no Ártico, comendo Halls preto e cheirando gelo seco. O dedo dele tinha um "centrômero": uma bola gigantesca exatamente no meio, onde eu pude enxergar além de pus: os OSSOS do cara, amarelados e com pedaços de carne por volta. Essa foto não chega nem perto; eu ia colocar outra, mas as meninas iam se negar a ler o post com uma foto próxima à imagem que vi. Desde o estágio no Fórum Viamonense, pensei que estava preparado para qualquer situação asquerosa (exceto BMG Videos), já que pouco me enojei assistindo a "Two Girl, 1 Cup". Mas aquele dedo... A despeito da visão infernal, que me fez ignorar cada palavra que ele falou depois, tentei manter a calma.
- Cara, o que é que tu fez nesse dedo?
- Eu tava catando lixo e deixer cair a tampa em cima dele... e tu acredita que me roubaram as latinhas ainda?
- Meu, tu tem que cuidar disso daí urgente! Tu foi ver isso já?
- Fui, fui, tava com curativo hoje, mas molhou e tive que tirar...
- E tu tá tomando alguma coisa?
- Sim, eu to tomando uns remédios aí...
- Mas onde tu consegue?
- Ah, ali em cima, ali...
Tive certeza de que ele não estava tomando remédios. Acho mesmo que o coitado tornou aquilo sua nova fonte de renda, mas pensei racionalmente: não posso resolver o problema dele de amanhã... então vou resolver ao menos o de hoje. E já que passará uma noite terrível, fria e extremamente dolorosa, que fume algo ou beba uma cachaça bem forte. Dei-lhe os R$ 5,00 que menos me fizeram falta na vida. Ele agradeceu e provavelmente foi comprar alguma droga tão pesada quanto a sua situação.

2º - O ATAQUE

Eu estava dormindo às 6:40 da manhã. No ônibus, é claro. Para compensar a triste sina de morar em Viamão e gastar 3h do meu dia em transporte, vou e volto em uma lotação completamente confortável, não muito diferente de minha cama. E sentado numa poltrona reclinável da fila de poltronas únicas (ato de puro egoísmo, para não acordar com um gordo fedido sentando ao meu lado), acordei às 6:41 (arredondadamente) com um barulho completamente assustador. Era como se o motorista houvesse ligado o rádio no volume máximo, só que em uma estação que não pegava (aqueles barulhos de TV que não pega). Acordei apavorado, com o coração disparado. Não entendi nada; contudo, não demorou muito para perder a lucidez de vez. Quando vi a poltrona única da frente tremendo sozinha, como se estivesse sozinha em um terremoto, saltei da minha poltrona pensando estar louco, completamente cagado.

Quando me virei para a poltrona da frente, de pé no corredor, vi uma cena tanto ou mais apavorante do que a do mendigo, já que, dessa vez, não fazia a MENOR idéia do que fazer: um cara estava se debatendo com muita força contra a poltrona, de olhos fechados e com uma cara de dor. Pensei em tudo em poucos segundos: seria um ataque cardíaco? Um exorcismo? Uma abdução extraterrestre? Depois, racionalmente, concluí que era um ataque epilético. E, como recomendado quando não se sabe o que fazer, deixei-o tendo seu magnífico ataque, e fiquei do lado dele de pé, cuidando para não ser babado. Nisso, levantou-se um amigo do cara e uma moça anônima, que provavelmente era enfermeira, ou muito metida, porque fingiu muito bem saber o que fazer. Ela segurou o pescoço dele, inclinando para cima levemente, e em breve ele parou de se debater, e passou a respirar muito ofegante, dormindo normalmente. Enquanto chamavam a ambulância, o motorista parava na Brigada Militar, a moça cuidava do convulsivo e eu interrogava o amigo:
- Tu já viu ele assim antes?
- Não, nunca vi...
- Ele sofre de epilepsia?
- Não sei, não sei... só sei que ele andava fazendo uns exames da cabeça aí...
- Tu trabalha com ele?
- Não, mas vou ligar pros caras lá, não se preocupa.

Quando a ambulância chegou, desceu um enfermeiro malandrão: "fala meu, vem na manha aí, te liga meu, não vai embolotar na roleta" e o enfermo cambaleou para fora do micro. Dias depois, descobri pelo amigo do cara que ele tinha batido a cabeça dias antes, e que sequer havia ido ao médico para ver isso.


* Os outros dois fatos restantes, hei de contar no próximo post. Um beijo no umbigo de cada um de vocês.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Um Post Sobre Futebol

PS: Este texto foi escrito após um acesso de raiva perante a antiga condição estressada de meu adorado pai, hoje (graças a Deus e às maravilhas medicinais) totalmente curado, torando os diálogos a seguir completamente incoerentes com a realidade atual da família.

Peraí, meninas, não julguem pelo título. Eu provavelmente vou favorecê-las muito mais do que aos jovens passivo-capitalistas, fanáticos por essa injusta fábrica de dinheiro que, segundo dizem, é a paixão nacional. E já olhem bem para a foto ao lado... como pode um homem gostar disso?

O negócio é simples: eu não acompanho futebol. Não é questão de gostar ou não; eu sinceramente penso que gosto, não sei se sinceramente ou se minto para mim mesmo, mas a questão é que eu quero e gostaria de gostar. Não, não é essa a questão, droga... enfim, resumo-me ao primeiro smile desde a criação do Tenha Muito Cuidado: :(

Hoje no jantar meu pai falava sobre futebol, e não conseguiu se conter ao me ver quieto e não insatisfeito em frente à sua pessoa na mesa. Era preciso fazer uma crítica. Aproveitou a desculpa do assunto da vez e começou dizendo que eu não gosto de futebol. Tudo bem, pensei, isso vai acabar logo. É... não. Passou a me acusar, ao lado de meu irmão (que, para se opor a mim, sempre acaba apoiando ele nessas discussões bobas), o qual sem razão nenhuma ajudava a me condenar como Herege Futebolístico.

- Fico me perguntando como tu pode ser tão alienado... não vê uma novela, não vê futebol... sobre o que tu conversa com as pessoas?
- Existem mais coisas além de futebol e novela...
- O quê, por exemplo? - velha tática dos exemplos. Quando não se tem o que falar ou argumentar, é sempre bom tentar contradizer o adversário com um simples pedido de exemplos. Infelizmente, eu já dominava essa tática.
- Tu só sabe conversar sobre futebol e novela?
- Não, eu sou um cara (início de frase muito conhecido) que consigo falar com qualquer pessoa, em qualquer lugar. Já tu não consegue falar com ninguém. - acusação infundada, já que ele não me vê 99% dos dias há vários anos.
- Como não? Tu nem me vê durante o dia; mas claro, eu fico calado o dia inteiro, de certo.
- Então quer dizer que tu só não conversa aqui em casa?
- É, basicamente sim.
- Por quê?
- É difícil falar com alguém que só entende de futebol e cerveja.

(Pausa dramática) Confesso que peguei pesado, errando de forma semelhante à dele.

- Tu acha mesmo que sou esse tipo de cara?
- Tu acha mesmo que eu não sei falar com ninguém na rua? - eu acho que sou o primeiro da casa que aprendeu a contra-argumentar as velhas e totalmente inúteis críticas paternas, que nunca acrescentaram sequer um ponto final na vida de nenhum de nós, só servindo para aliviar as tensões do dia de um trabalhador da classe-média brasileira. Essas minhas táticas atuais, no entanto, só o irritam mais, por não poder ficar irritado contra alguém que o contradiz da única maneira que ele não consegue: com fundamento. Meu irmão resolveu se intrometer:

- O mais estranho do Lucas (ele nunca fala diretamente) não é que ele não gosta de futebol. É que ele não gosta de esporte algum. - irritei-me. Ele é o tipo de pessoa que não sabe chutar um cubo de gelo, e que troca um jogo importante por qualquer assunto pessoal.
- Por que isso incomoda vocês? É um defeito não gostar de futebol? - erro meu: não se pode fazer perguntas óbvias, pois a resposta vai ser sempre a não-óbvia, só para dar um impacto dramático.
- É, é um defeito sim! - diz meu pai com toda a razão (ele sempre tem razão).
- Olha o absurdo que tu tá falando! Tu quer impor teus gostos - e eu quis dizer que isso é ignorância, mas não seria adequado enquanto não pago minhas vestimentas - é a mesma coisa que eu dizer que quem não gosta de música é louco! - insisti no erro, sou mesmo um bocó.
- E é! Quem não gosta de música é louco!
- Então a mãe é louca? - ponto positivo pro Conrado. Ele, é claro, muda de assunto.
- Não dá pra entender que uma pessoa da tua idade não gosta de futebol.
- Eu não disse que não gosto, eu só não sinto necessidade de assistir, principalmente quando tá numa fase ruim. Pelo menos não sou hipócrita, eu não gosto de ver perder e não vejo. Mas já que é assim, a partir de amanhã vou assistir todas as partidas contigo, pra não ser mais um alienado ignorante, né?
- Eu nunca te obriguei a assistir, eu nunca te tirei do teu quarto pra ver um jogo comigo, tirei?
- Nem vai, é totalmente absurdo querer obrigar alguém a gostar de alguma coisa, pensamento mais ultrapassado.
- Eu acho que cada um gosta do que quiser (argumento irônico); eu sou feliz (argumento hipócrita) assistindo meu futebol toda quarta, domingo, enquanto teu domingo é sempre igual (argumento ignorante), tu passa com tua namorada no quarto (argumento forçado)... imagino quando tu casar, teus domingos vão ser horríveis (auto-mentira). - Eu senti que ia ser uma total perda de tempo e energia seguir com o assunto, já que a comida estava esfriando. Concordei, esperei mudar o assunto e saí de lá. Meu pai constantemente teve alguns acessos de raiva, aliás, há alguns anos. Infelizmente, deixo-me levar e acabo me irritando também, absorvendo um pouco da energia destrutiva, que a doença do estresse costuma transpassar.

Pergunto-me. Por que eu gostaria de um time, afinal? Uma instituição altamente sem sentido, em constante mudança, nunca estável. O que me faz ser mais gremista, ou menos corinthiano? O local? Então o que me faz ser gremista, e não colorado? Afinal, por que eu deveria admirar um grupo de homens que ganham muito bem para correr e chutar? Por que deveria me orgulhar de um time que existe há cento e poucos anos e é dono de um passado totalmente racista?

Ademais, times... são todos iguais, convenhamos! Flamengo, Corinthians, Grêmio, Inter, Cruzeiro, ora, são jogadores brasileiros, ou até estrangeiros... por que eu devo escolher um time tendo como base o meu local de nascimento, se a base dele não é daqui? Eles perdem, ganham, perdem, empatam... como vou saber se ano que vem vão ganhar mais do que perder, ou vice-versa? Por que diabos, então, sou gremista? Pelo mesmo motivo que sou batizado!

Já, a seleção... tá, concordo que não sou lá muito ufanista, mas é outra coisa. Primeiro, é um time representando todos os outros. Segundo, tudo que é a nível mundial é mais interessante. É como se fosse uma guerra santa, e nós pudéssemos aniquilar com os EUA em 90 minutos. Fora isso, é tradição as constantes vitórias do Brasil, e isso amedronta os outros. Eu não tenho o menor orgulho de ser brasileiro; mas sim de torcer pela seleção.

Deixei-os após tudo isso vendo o jogo do Grêmio. Fui estudar no quarto. Ouvi barulho de tiro vindo dos vizinhos e fui ver o que acontecia. O Grêmio perdia de 2x0, e meu pai levantou-se e foi dormir, dizendo que não tinha mais nem vontade de assistir. Perguntou ao meu irmão se ele continuaria vendo, e este disse que sim, que ia assistir até o final. Saquei na hora. Fui ao meu quarto por mais 10 minutos e voltei à sala silenciosamente.

A que vocês acham que ele estava assistindo?

Bom, o fanático futebolístico não assistia ao jogo coisa nenhuma! Ao contrário disso, algum "interesse pessoal" lhe pareceu mais importante do que ver seu próprio time, e assim que entrei na sala ele trocou rapidamente de canal para que a vergonha fosse amenizada; botou em um canal de documentário. Então senti aquele momento de brilho: era a minha hora.

- Legal o jogo que tu tá assistindo, hein! - puft, tapa na cara. Ele já se sentia culpado antes mesmo de eu chegar. Ainda assim, é claro, tentou argumentar.
- Tu já viu como tá o jogo?
- Ah, achei que era "com o grêmio, onde o grêmio estiver". Que engraçado, isso... na derrota então, todo aquele orgulho cai, e no fim das contas tu assume a mesma postura que eu. A diferença é que eu não sou hipócrita.
- Tá, tá... eu não quero discutir. - se entregou. No dia em que ele achar que tem o mínimo de razão e não quiser discutir, vão encontrar vida na lua.
- Então vou te falar uma coisa. Para de tentar aparecer na frente do pai que fica menos pior pra ti. - fui dormir sem resposta; foi como se eu estivesse envenenando uma velhinha.

Eu não tiro a razão desse egocêntrico promíscuo; é mais coerente querer ver a beleza feminina do que 22 homens suados disputando por bola. Mas às vezes penso que é melhor ser necessariamente transparente quanto às suas decisões, e ser duramente criticado por isso, do que assumir uma postura qualquer só para aparecer, e depois ser pego contrariando-a. Isso, sim, é bem ridículo.

Não sei se é pela carga excessiva de estudo ou se uso isso como desculpa, mas definitivamente não sinto a menor vontade de acompanhar um jogo do Grêmio. Digo Grêmio, e não Inter, porque para mim Inter é sinônimo de Demônio desde meus 5 anos, devido à minha criação quase que medieval. Grêmio é a paz, e eu nem sei por quê, já que não sinto isso de fato, e muito menos ao pensar racionalmente. Banheiros queimados, ódio pelo adversário, brigas de torcida... Paz? Ok, pai, vamos falar de futebol.

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