domingo, 16 de janeiro de 2011

Uma Noite de Extrema Ação

Às 21h do dia 14 de janeiro de 2011, eu e Max combinamos de sair; pois, passamos a organizar tudo. Combinei de estar lá na sua casa às 23h, e então sentei em frente ao piano e lá fiquei até as 23h30min ou algo próximo a isso. Depois, tomei um banho e, resumindo, cheguei bem depois da meia-noite no seu apartamento perimetral de Porto Alegre.
Subi. Tomei duas cápsulas de uma droga estimulante, com o propósito de anular meu sono. Em poucos minutos, já estava bem disposto. Tomei alguns goles d'água e decidimos partir. Chegando no térreo, Max lembrou-se de algum objeto que faltava, do qual ainda não tenho conhecimento, tendo ele subido novamente para buscar. Enquanto isso, conversei com o porteiro, vulgo "Dentinho" - alcunha facilmente justificável após uma breve conversa com o magro trabalhador noturno. E foi o que fiz: enquanto Max demorava-se à procura de sei la o quê, tentei fazer uma breve análise psicológica da experiência daquele porteiro que, conquanto leigo, sabia demasiado acerca da estrutura política e econômica da cidade. Tão logo me convencia de seu ponto de vista deturpado, o outro voltava, e íamos em direção a um porão que há em um beco lá pelas redondezas. Chegamos lá e algo estranho já se nos passava: o segurança nos aconselhou a não entrar. Que diabos de lugar é esse no qual o segurança orienta os fregueses a não entrar? Pois é; mas meu instinto eloquente nos criou uma oportunidade, tendo o segurança dito: "então pergunta pra aquela moça se tu pode entrar.". A moça em questão era uma figura moderna, com cabelos curtos e arrepiados com algum produto muito resistente, piercings espalhados ao longo de toda a sua face, tatuagens insistentes habitando seus braços e pernas - o que se fazia visível perante os trajes curtos e nada sensuais que a simpática jovem vestia. Perguntei-me o que ela faz ali, mas não era hora de questionar as regras do jogo, e sim de traçar uma estratégia para vencê-lo; e o fiz.
- O nosso amigo segurança me disse que tu é a autoridade máxima desse lugar. Por isso vim te pedir licença para entrar.
- Depende.
- De?
- Do teu time. Gremista ou colorado?
Eu odeio esse tipo de condição por tantos motivos; primeiro, ter um time não determina o seu caráter - no máximo, a ausência dele. Segundo, que diferença faz a porcaria do nome da instituição que arrecada a grana que o povo leigo oferece a onze funcionários, cujo ofício é chutar um pedaço de borracha? Frase longa, mas verdadeira. E, por último, detesto desafios que não envolvam o intelecto - única diferença entre o homem e o orangotango. Pois bem; ao passo que me remoía por dentro em torno destes postulados, fui analisando seu rosto na tentativa fúnebre de adivinhar para qual time aquela aberraçãozinha torcia. Sem sucesso, parti para o plano B.
- Eu sou neutro;
Ela parou por uns segundos, com o mesmo delay de um cachorro ao ouvir um barulho que nunca havia escutado antes. E então decidiu-se por...
- Ah, neutro? Espertinho... tu é gremista!
- Eu não sou...
- Colorado?
- Neutro...
- Haha, então tu é corinthiano!
- Não.
- Documento?
(Mostrei-lho)
- Viu? Não disse? Tem até cara de corinthiano!
- Eu já disse que sou neutro... - tentei manter a simpatia facial.
- Hmm... tá bom, pode entrar então, senhor "neutro".
- Obrigado, senhora "porteira".

Felizmente ela não registrou, mas o declínio de autoridade foi o primeiro sarcasmo da noite. E entrei. Max veio logo atrás, provavelmente desfrutando de minha artilharia.
A festa estava murcha. Havia um número razoável de pessoas, mas a maioria era composta de homens e emos. As poucas corpusculosas de Barr concentravam-se ao redor do balcão no andar de baixo. É para lá que nos dirigimos. Pedimos uma cerveja e bebemo-la tão rápido que, se eu regurgitasse, a teria de volta no mesmo sabor e na mesma temperatura. Ao nosso lado, a primeira cena freak: duas meninas altamente pegáveis beijando-se. Puxei meu celular na mesma hora e posicionei sua câmera, tendo registrado o momento com uma fotografia. No mesmo momento, uma doentia amiga do casal pôs-se contra meu natural e saudável ato.
- Ô meu, tu é um $#!@%*, fica tirando foto das mina meu, pra que isso?
Confesso que fiquei um tanto surpreso pela reação exagerada daquele verme.
- Peraí... quer dizer então que duas gurias se agarram enlouquecidamente na frente do balcão de um bar lotado, e a amiga delas quer privacidade?
Ela pensou no que cospir de volta, enquanto as duas ainda se agarravam sem sequer ouvir uma só palavra; a coisa começou a ficar mais séria ao longo do tempo, tendo uma agarrado o cabelo da outra, deliciando-se numa cena promíscua e pecaminosa.
- Mas é a imagem delas, meu! Deixa de ser #$@#$!
- Olha, pelo jeito elas não estão se importando muito... então eu acho que tu tá é com inveja, porque convenhamos: eu não tiraria foto de ti nem se tu estivesse beijando o pênis de um porco...
Os próprios amigos dela riram, junto de mim e de Max, que acompanhava a cena com muita paciência. Ela tentou balbuciar algumas palavras de ofensa por trás do seu cabelo curto e lambido a la mendigo emo, mas já era tarde. Afastaram-se todos, e pedi mais uma cerveja para contemplar a segunda ironia da noite.

Meio tonto, saímos ambos dali em busca de nada. Ao longo da noite, encontramos diversas personalidades femininas, dentre elas até mesmo duas viamonenses. E mais de uma hora depois, avistamos mais duas moças sentadas e apagadas, encostando-se uma na outra. Era-me óbvio seu estado volátil e alcoólico. Analisamos por mais alguns minutos, e então uma delas começou a cospir no chão, como se faz na véspera do vômito. Instintivamente, sentei-me ao lado desta e aconselhei-a a ir ao banheiro. Ela não conseguiu responder; (isso vos lembra alguma coisa? http://tenhamuitocuidado.blogspot.com/2010/04/aventuras-no-porao.html )
Fiquei mais um tempo sem saber como agir, enquanto Max me observava em pé, a alguns metros, claramente reprovando a perda de tempo. Max é um sujeito muito durão.
Não demorou para que surgissem três outros caras, estacionando seus perfis fracassados em frente ao sofá onde nos reclinávamos, eu e as meninas. Com um sorriso tosco, queriam parecer malandros ao tentar acordá-las com palavras grossas e ofensivas, o que me deixou contrariado. Um deles chegou a me olhar, julgando que não me importaria; este mesmo cara ousou tocar nas pernas descobertas da outra menina, que estava inconsciente, e então levantei-me, afastei-o pelo ombro e estendi o dedo indicador na sua face:
- Tira a mão, meu!
Ele ficou surpreso, mas logo recompôs sua máscara de falsa coragem e rebateu:
- E seu quiser botar a mão, tu vai fazer o quê?
- Tenta de novo e tu vai descobrir!
O cara chegou a tentar alcançar a coxa direita da menina, mas antes que completasse, empurrei-o com os dois braços, tendo ele caído de costas no chão. Nisso, os dois amigos vieram contra mim, tendo eu acertado um soco no olho de um deles, que também caíra, enquanto o terceiro agarrara meus braços. Eu teria sido espancado, não fosse o Max agarrar o pescoço desse, permitindo que eu me soltasse. O primeiro cara estava já levantando, e, mais por prevenção do que por defesa, chutei-o no peito, tendo rolado por mais alguns metros. Nesse momento, a multidão já estava formada, e a cena de combate circulada era composta por um sofá, duas meninas dormindo, dois sujeitos no chão, um agarrando outro pelo pescoço e eu, contemplando tudo ao meu redor com o sangue mais quente que água de chimarrão.
Max me olhava e gritava algo, provavelmente querendo que eu soqueasse o cara enquanto ele o agarrava, mas eu disse "SOLTA ELE, MEU, SOLTA" e o Max soltou; o cara caiu no chão e logo se lavantou, vindo em minha direção com um olhar indeciso de quem quer recompor seu orgulho desintegrado diante de uma multidão. Ele era mais alto que eu, apesar de mais magro, e parecia tão pálido quanto um copo de leite; esperei-o por alguns segundos, mas antes de ele se aproximar muito, fui correndo em sua direção. Lembro-me de acertar ainda mais um golpe, e de ter recebido outro; Max então despejou inúmeros chutes no rapaz, que caiu novamente, e a luta seguiu no chão. Não acompanhei a cena por muito tempo, porque um dos outros dois me acertara a nuca por trás, tendo eu dado alguns passos para frente, meio tonto. Antes de me virar, deu-me um chute nas costelas esquerdas, e então caí. Virei-me de imediato - a dor já não era prioridade - e o sujeito seguiu chutando-me enquanto eu estava no chão. Agarrei seu pé de apoio e rolei por cima com toda a minha força, tendo ele caído nas grades que separavam um ambiente do outro mais acima. Levantei com uma raiva que anulava meu cansaço absoluto. Ele estava reclinado na grade-parede, e eu desferi três ou quatro socos divididos entre seu peito e seu rosto. Destes, ele não vai se esquecer tão cedo. Não lembro que fim levou esse, porque o segurança já me agarrava por trás com uma agressividade abusiva. Fui levado como um criminoso para a saída, e lá me abandonaram sem muita preocupação posterior. Logo então trouxeram o Max, o seu adversário e o primeiro marginal que abusava da menina. O último cara, com quem tive mais contato, não aparecia nunca. Três seguranças faziam um discurso forte e periférico, mas não ouvi uma palavra sequer. Uma mulher ofegante chegou a pronunciar a palavra "ambulância", mas de fato não dei muita bola. Não me arrependia de ter feito o que achava mais justo, e mais: deveriam ter apanhado o triplo. Na hora, sequer fazia idéia da dimensão heróica dos fatos: eu não brigava desde a sexta série. Porém, alguns minutos depois, quando decidimos sair dali antes de nova confusão, fomos (meio cambaleantes, é bem verdade) nos afastando, e ao chegarmos a algumas quadras de lá, na esquina da Alberto Bins, paramos um pouco, respirando ofegantes. Então sorrimos de prazer.
É difícil entender a sensação que uma ação extrema desemboca em seu organismo. É como uma explosão de neurotransmissores agindo ao mesmo tempo, uma absurda dose de adrenalina seguida de um orgasmo contínuo e doloroso. As primeiras dores começaram a surgir; por sorte meu rosto não foi ferido... mas minhas costas estavam completamente debilitadas, dificultando mesmo a respiração. Ao fundo, da Independência, ouvíamos a sirene da ambulância.
- Cara... - disse o Max - o que foi que a gente fez...
Rimos de novo. Três contra dois é uma disputa tendenciosa, na qual ninguém apostaria na minoria. E o melhor: o motivo era nobre e moral, ao contrário da maioria das brigas que ocorrem por aí, muitas vezes acarretando mortes gratuitas. E por falar nisso...
Da Cel. Vicente, ouvimos alguns berros do tipo "eles foram por ali!". Nos olhamos; não era possível que isso não teria acabado... os caras deveriam estar mais machucados que nós. Olhamos lá da esquina, e o que vimos desta vez nos apavorou mais do que qualquer outra coisa. Eram quatro sujeitos: os dois que saíram com a gente e mais outros dois caras, aparentemente mais jovens, que não participaram de nada lá dentro.
Nos olhamos apreensivos; era preciso tomar uma atitude impulsiva... pois o tempo era curto.
- Cara, a gente corre ou enfrenta? - questionou-me Max a pergunta que justamente passava pela minha cabeça.
- Tá louco? Eles são quatro agora... não tem como...
- Cara, de qualquer forma eles vão correr mais...
Não deu tempo de concordar ou discordar. O primeiro sujeito (o que passara a mão nas coxas da menina logo no início) dobrava a esquina, e o Max prontamente já lhe acertava um joelhaço na genitália. Este não vimos mais. O segundo, logo depois, já tinha percebido que estávamos ali, mas não me tinha visto, tendo-me aproveitado disso para soquear seu queixo com a força que me restava. Os outros dois foram no Max, e eu me vi obrigado a atacar pelas costas de um deles, chutando-lhe as costelas como me foi feito antes. Este era com quem o Max havia lutado no chão da casa noturna, e mais uma vez estava no chão. O outro (um dos estranhos) seguiu lutando com o Max, e aquele cujo queixo eu recém havia acertado me dera um golpe (não sei bem se um chute ou um soco) nas costas novamente, mais acima. Não cheguei a cair, mas antes mesmo de me virar, o sujeito desconhecido me golpeou com uma "gravata", tendo quase me imobilizado; ele certamente me teria espancado naquelas condições, mas preferiu estupidamente tentar me derrubar. Agarrei-o e fomos ambos para o chão, mas logo me levantei. Max também estava no chão, parado, quando notei o que estava acontecendo;
O sujeito estranho que lutava com ele havia tirado uma faca.

Eu pronunciei as primeiras palavras desde o início de tudo isso, mas não as lembro bem; tentei convencê-lo a desistir da faca, que ninguém precisava se machucar mais do que isso, e que não estávamos armados. Aos berros, o sujeito nos mandava calar a boca, e o outro, já levantado, ficou de pé ao seu lado, e também tentou convencê-lo a largar a faca, alegando que já tinham nos dominado. O cara estava totalmente descontrolado, dizendo que ia nos furar, porque a gente apagou o amigo dele. Imagino que o cara que não saíra com a gente da casa estava inconsciente... mas tenho certeza que não foi fatal. A cena agora era totalmente o inverso da outra: dois caras no chão, eu e o Max encurralados na parece de um prédio na esquina superior da Alberto Bins com a Cel. Vicente, um sujeito ensanguentado de pé ao lado de outro maníaco com uma faca em punho, apontando para a nossa cara. O outro ainda tentava convencê-lo, mas o cara estava decidido por nos esfaquear... provavelmente temendo a repercussão do ataque, o outro estranho segurou seu braço, e foi essa fração de segundo que me fez agir impulsivamente, tendo acertado o nariz do sujeito com a dobra unida dos meus quatro dedos da mão direita. O cara sangrou na hora, caindo nos braços do outro, e o Max começou a chutar seu peito com muita força, tendo ele largado a faca e caído com força no chão, provavelmente batendo a cabeça na calçada. O outro, nessa hora, decidiu por correr, atravessando a rua e subindo em direção à Santa Casa, enquanto eu chutei a faca do vagabundo para o meio da rua e também corremos na direção contrária. Ensanguentados, trêmulos e suando mais que um retirante camelô, pegamos um táxi até a casa do Max.

Quando chegamos, ele botou a mão no bolso procurando as chaves, mas o porteiro abriu calmamente, como quem gozara da paz noturna no canto seguro do lar burguês.

Entramos no elevador e não apertamos nenhum botão. Ainda estávamos em estado de choque.

10 comentários:

Max disse...

Isso rende uma trilogia meu amigo!

Max disse...

O foda vai ser se o porteiro contar que entramos ensanguentados no prédio, ai eu me fodo...

Liliane disse...

A coisa toda poderia ter acabado muito mal... Já vi muitos homicídios que começaram assim... Precisam ter mais cuidado meus jovens, muito mais! A vida de vocês é muito valiosa.

francielle disse...

Cabeçudo!!!
Só o que faltava, eu e o Diogo termos que voltar pra aí pra irmos no teu enterro, heheh...
Te cuida...não quero perder um dos meus melhores amigos!!!

Lucia Mendes disse...

Bah!!!! Que horror!!! Sem palavras...fiquei sem fôlego junto!!!
Mas foi sorte...e o irônico é que tens um blog chamado "Tenha Muito Cuidado"...só rindo para não chorar.
Bjo

Diogo disse...

Fiquei tenso, sério. O pior de tudo é que tu teve um motivo nobre e deve ser parabenizado, e não xingado. Ainda assim, essas gurias que bebem nas festas até cair não merecem proteção.

Anônimo disse...

No máximo uma camisinha.
[Diogo]

Max disse...

Uma pílula já tava de bom tamanho, husahsauh.

rafa disse...

E no fim, comeu?

Pedro Dick disse...

Caralho, que aventura. Como ficou teu rostinho angelical depois dessa?