segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Great River Revisited

(by Lucas Pessoa)

Havia duas semanas que preparavam tudo para mim. Eu sou do tipo que gosta de organizar as coisas não na última hora, mas nos últimos dez minutos, e não foi diferente: faltavam alguns minutos quando comecei a arrumar a mala para Rio Grande.
E tudo que eu fiz foi jogar alguns livros e algumas cuecas dentro de uma mala grande, a qual sequer precisei procurar. Tudo pronto. Apesar de minha mania de simplificar tudo, não podia ser diferente: havia uma pressão de 10atm sobre minha cabeça, meu querido tio me ligando a cada cinco minutos. "Documentos?", "sim, tio". "Que horas é a prova?", sendo que ele já o sabia muito bem. No entanto, sua preocupação foi e sempre será muito bem-vinda, além de engraçadíssima.

Mas infelizmente alguém próximo de mim possuía um dom incrível de pisar fora do quadrado: sua irmã (ou minha mãe, se preferirem). Para tanto, um flashbackzinho cairia bem:

Em 2008, segundos antes do vestibular, tudo estava pronto, até que, antes de descer do carro e entrar no colégio, minha mãe me convenceu a tirar o documento da carteira e levá-lo solto. Resultado: perdi a carteira de identidade e só fiz a prova porque estamos no Brasil.

Voltando aos dias atuais, mais precisamente no sábado, antes da viagem... eu já havia dito que iria de bermuda, e não de calça. No bolso da bermuda já estavam o celular e toda a quantia de dinheiro necessária para a passagem de volta + táxi até a FURG + alimentação. Eu já havia dito mesmo que não ia tirar a bermuda, mas ela me convenceu na última hora. Resultado: esqueci o celular e toda a grana, só percebendo isso depois de 40min de Porto Alegre, quando pensei em ligar para eles. Passaram a semana inteira me avisando para levar o carregador de celular, o qual eu levei, mas uma coisa é certa: não me avisaram para levar o celular em si.

A viagem foi tranquila e rápida. Senti-me bem menos perdido quando, ao chegarmos nas periferias de Rio Grande, o meu companheiro de poltrona resolveu abrir a boca pela primeira vez para perguntar se já havíamos passado pelo bar do GRILL, que ficava a duas horas e meia dali PARA TRÁS. Mal pude responder e a TV ligou-se, passando um filme breve e inspirador sobre as belezas naturais da cidade de Rio Grande. Foi a parte mais engraçada da viagem: olhando para a tela e, após, para a janela, nem mesmo um nativo diria que era o mesmo planeta. Preferi olhar só para a tela e imaginar que era tudo como o motorista me mostrava.

Ao chegar, ao menos, havia uma amiga do meu tio me esperando, a qual já sabia de tudo, me emprestando seu celular e o dinheiro necessário. A mesma me disse que, caso quisesse algo, era só procurar o CANALETE, que seria um lugar com um riacho no meio e calçadão por volta. "Lá é o point de Rio Grande!", disse ela. E eu acreditei.

Passei horas procurando o canalete no primeiro dia. A ideia era procurar uma Lan House. Fui para o lado errado, mas como toda cidade pequena, sempre há alguém cujo hobby é orientar. Sequer lembrando o nome do local, perguntei por um riacho com calçadão para um segurança, que logo me disse que haviam dois. Fiquei constrangido quando completei com "bares", e ele me indicou que estava a umas 10 quadras, e já era noite, então apressei o passo. Na rua, só havia um cão, ao qual pedi gentilmente que me levasse ao canalete (é sério), mas ele me encarou com uma baba escorregando - o que compreendi por "odeio turistas". Segui em frente ansioso pelo point da cidade. E cheguei.

Quando dobrei a rua e vi o tal riacho, numa imitação barata da av. Ipiranga, tive que rir. Era sábado à noite, quase 22h no point da cidade, e olhei para os dois lados: não havia sequer um cão.

Aproximei-me do riacho e vi uns girinos à luz da lua. Compreendi o significado de point ao me deparar com as milhares de cabecinhas pontiagudas desses animais. Segui caminhando em linha reta até pensar em desistir, e umas cinco ou seis quadras adiante encontrei o primeiro (e único) bar, que perde até para a decadente PETISKERA viamonense. Foi quando ri comigo e voltei pelo lado oposto da rua, pensando "imagina só, e eu querendo encontrar uma Lan Hou...." Dei-me de cara com uma placa: Lan House.

Dentro desta, havia apenas 3 sujeitos. Pedi 15 minutos, só queria ver o site da FURG. Um destes retardados, penso, só devia ter um amigo, com o qual falava em uma conversa de áudio AOS BERROS E GARGALHADAS, o que me incomodou ao extremo. Saí antes dos 15 min acabarem, extremamente arrependido dos meus 50 centavos mal investidos. Perdi-me na volta, o que não necessariamente significa que tive dificuldades para chegar em casa. Todas as ruas do centro de Rio Grande convergem para uma espécie de miniatura de Redenção, praça cujo nome não sei até agora. De lá, achei o apartamento no qual estava (sozinho, abandonado e infeliz. Chorem por mim.).

No dia seguinte peguei uma bicicleta e fui pedalar, depois de cinco anos de abstinência. Onde? No canalete, é claro. Ao chegar, notei que as mesmas pessoas caminhavam nos mesmos locais numa frequência de alguns minutos. Não mudava, mesmo, pura ilusão. No entanto, para ver algo diferente, abusei olhar para o outro lado da rua (aquele por onde voltara no dia anterior), e vi uma cena incrivelmente alternativa: um cachorro de cadeira de rodas. Sem comentários.

Pouco adiante, me debrucei na janela de uma igreja evangélica e acompanhei um grupo de velhinhos cantando Gospel. Achei demais, em que pese suas constantes desafinações.

Pela noite, no domingo, sentia-me muito isolado no apartamento, muito mesmo. A sorte era que a amiga de meu tio havia me emprestado o celular.

Não demorou muito: a bateria acabou e eu fui Canaletado.

9 comentários:

Max disse...

Que "Saga" hein?
Boa sorte neste vesitba!
E não desanime caso não sejas aprovado, pois o sucesso é consequência de nosso empenho, e atitudes!
Abraço.

Liliane disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Liliane disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Liliane disse...

Estou eu aqui, no júri, as gargalhadas, imaginando a Rio Grande que conheci há 30 anos e que, ao que tudo indica, continua a mesma... Ou quem sabe, um pouco pior...
Imagine a cena: O Dr. Navarro defendendo o réu de uma tentativa de homicídio qualificado e eu gargalhando e tentando disfarçar...
Precisavas ver a fisionomia das juradas...

Ps.: concordo com o Max

Liliane disse...

Olha o resultado de ficar rindo no Júri... Postei o mesmo comentário três vezes?!?!?! Bah! Nem sei como?
Por respeito, deletei duas.

Lucas disse...

Só tu mesmo pra me fazer gargalhar até de longe hahahaha
Eu literalmente gargalhei da tua gargalhada! Imagino MUITO a cena, não consigo parar de rir!

O Navarro deve estar até agora confuso, isso é muito mais engraçado do que um cachorro cadeirante!

Um beijo aos dois comentaristas!

Marcelo disse...

como sempre, muito bom!!

Sergio Trentini disse...

Boa sorte, Luke! Continue enxergando as coisas assim. Cada vez melhor.

francielle disse...

E afinal...como foi no vestibular???